“Entre a desonra e a guerra, escolheste a desonra, e terás a guerra”, Winston Churchill
Um dia depois de ter jurado não invadir a Ucrânia, Putin anunciou a sua “pacificação”. Um dia depois de anunciar “manobras pela pacificação”, anunciou a entrada das tropas. No mesmo transe que fala da paz, alude a armas nucleares.
Putin mente, é certo. Fá-lo com a maior desfaçatez e com a sensação de impunidade que lhe dá ocupar o lugar que ocupa, seja directa, seja indirectamente e por interposta pessoa. Contudo, o mais grave é que fez políticos ditos experientes acreditarem nele enquanto fazia uma estudada (embora não inteiramente bem-sucedida) planificação de algo que é uma guerra não apenas aos ucranianos como a uma Europa que, cada vez mais, está enfraquecida.
É verdade que os últimos dias têm sido pautados por uma reacção mais articulada, mas tal parece dever-se mais à pressão da opinião pública do que a uma vontade real de fazer frente a alguém que já aludiu ao dito botão “vermelho”.
Acreditar que Putin usará ou não as armas nucleares consoante o deixemos em paz na Ucrânia é não perceber a tendência “imperialista” e as similitudes que o mesmo apresenta com outras personagens tristemente célebres e que ficaram conhecidos pelos milhões que mataram. Ceder às suas ameaças é deitar gasolina num incêndio, já que um louco como Putin não se trava com bom senso. Foi, aliás, o bom senso que nos trouxe a esta guerra, que não é diferente de outras.
As imagens falam por si e, se há coisas que as mesmas nos trazem, são, de um lado, uns heróis anónimos e, por outro, a profunda desonra não apenas dos que matam acriticamente como dos que deixaram que tal sucedesse. Pode criticar-se muita coisa em Zelensky e aludir ao seu amiguismo com os Estados Unidos, como se faz num certo tipo de discurso. Não se pode, contudo, criticar a falta de coragem. Os que o fazem terão que se perguntar se não teriam aceite cobardemente a boleia e virado costas a uma morte provável.
Sei-me desalinhada com muitos que procuram justificar o comportamento de Putin com incidentes prévios, como se os mesmos pudessem merecer esta resposta. Sei-me desalinhada, também, com os que pretendem a total neutralidade em função de acharem que o actual Governo da Ucrânia integra fascistas (aconselhando eu que vão verificar em que partido estavam maioritariamente eles e se não terão perdido as eleições). O meu olhar estará sempre nas vítimas civis, as quais não foram tidas nem achadas quando lhes estilhaçaram hospitais e residências. Sei-me, por último, desalinhada com os que optam pela neutralidade através da alusão a outras guerras, igualmente criticáveis. Não é o meu caminho.
Hemingway escreveu que “o mundo quebra toda a gente, e depois muitos ficam mais fortes no lugar da fractura. Mas àqueles que não consegue quebrar mata-os”. O que devemos exigir é que as palavras de Hemingway, neste caso concreto, não se concretizem mais. E devemos fazê-lo sabendo que do outro lado não existe respeito, não existe honra e não existe o mínimo toque de humanidade.
Putin escolheu a guerra e fê-lo com desonra, não sendo certo que a guerra que tem programada se fique, sequer, pela Ucrânia. Saibamos nós dar a resposta certa a quem trata melhor os seus cães do que crianças, até porque as atitudes dos cães danados só devem ser toleradas nas obras cinematográficas.
A autora escreve de acordo com a antiga ortografia.