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“Há cada vez mais americanos a investir em imobiliário em Portugal no pós-Trump”, diz CEO da Keller Williams

O pós-Covid e a instabilidade política criada com o regresso de Donald Trump à Casa Branca estão a levar a classe média americana a emigrar para Portugal ou a transferir os seus investimentos imobiliários para o país, tendo em conta a instabilidade e a menor rentabilidade que estimam ter nos próximos anos nos Estados Unidos. A ideia é transmitida em entrevista ao Jornal Económico (JE) por Marco Tairum, CEO da mediadora imobiliária norte-americana em Portugal.
27 Maio 2025, 07h00

O pós-Covid e a instabilidade política criada com o regresso de Donald Trump à Casa Branca estão a levar a classe média americana a emigrar para Portugal ou a transferir os seus investimentos imobiliários para o país, tendo em conta a instabilidade e a menor rentabilidade que estimam ter nos próximos anos nos Estados Unidos.

A ideia é transmitida em entrevista ao Jornal Económico (JE) por Marco Tairum, CEO da mediadora imobiliária norte-americana Keller Williams em Portugal, que, nos primeiros três meses do ano, registou no nosso país uma faturação de 17 milhões de euros, o que significou um aumento de 23% no volume de negócios dos consultores face ao período homólogo do ano anterior. Além dos resultados operacionais, o início de 2025 fica também marcado pela expansão da empresa para a Região Autónoma dos Açores.

Este crescimento no volume de negócios ficou dentro das vossas expetativas?

Os 17 milhões de euros significam o nosso melhor primeiro trimestre de sempre em faturação e a continuidade do trabalho que temos vindo a fazer.

Estávamos à espera deste crescimento, sem dúvida, e nesta ordem. Está muito em linha com as nossas previsões, porque estruturalmente o mercado tem, neste momento, reunidas todas as condições para que, pelo menos durante os próximos 18 meses, continue a haver condições favoráveis para que a mediação obtenha bons resultados, por duas razões.

Em primeiro lugar, porque continua a haver uma escalada de preços e isso influencia naturalmente a nossa faturação da mediação como um todo, uma vez que cobramos uma comissão sobre o valor de venda das casas. Portanto, havendo uma subida dos preços das casas, naturalmente somos positivamente impactados por isso.

Em segundo lugar, apesar deste bom momento, continua a existir alguma incerteza legislativa ligada à compra e venda de casa e mesmo ao próprio arrendamento, o que faz com que a penetração da mediação tenha vindo a aumentar.

Também esperávamos que o nosso negócio crescesse, porque temos vindo a consolidar, por um lado, o nosso crescimento em número de consultores e em número de operações e, por isso, é natural que, com uma maior penetração da KW no mercado português e com ganhos de quota de mercado, continuemos a ver a nossa faturação aumentar.

Quais são as estimativas para o segundo trimestre?

Tendo como indicador os resultados de abril e início de maio, continuamos exatamente com a mesma dinâmica, a crescer à volta dos 23%. Mais uma vez, não há, neste momento, pelo menos no curto prazo, alterações significativas estruturais, quer internas, quer externas, que levem a acreditar que esta dinâmica se altere, muito pelo contrário.

Pelo menos a nível interno, uma vez que este primeiro trimestre também assinalou a entrada da KW no mercado açoriano, onde cumprimos a nossa primeira operação.

Temos um plano de expansão ambicioso para continuarmos a cobrir a totalidade do território nacional e acreditamos que a nossa faturação continuará a aumentar, em linha com o que tem acontecido, pelo menos desde o início do ano e, quiçá, com o amadurecimento das novas operações, possamos ambicionar um valor superior para o resto do ano.

A faturação média neste primeiro trimestre foi de 800 mil euros por mês. Podem chegar ao um milhão durante este ano?

Acredito que sim. Existe alguma sazonalidade no mercado da mediação. Tradicionalmente, o segundo semestre, mas muito particularmente o último trimestre, é historicamente o trimestre mais forte para a mediação. Ao contrário do que acontece noutros mercados, nomeadamente nos Estados Unidos, há este fenómeno em Portugal, onde o último trimestre é habitualmente o mais forte em todo o setor.

Que razões encontra para esse fenómeno?

É um misto de cultura com fatores, vamos dizer, económico-financeiros. Acho que culturalmente deixamos as grandes decisões para o final do ano. Quando olhamos para a dinâmica de trabalho em Portugal, a dinâmica das famílias, sentimos que o primeiro trimestre é de reorganização, de tomada de decisões e implementação daquilo que queremos fazer e que definimos como objetivos no início do ano.

Depois, acontece um fenómeno extraordinário: a partir de maio, começa a estar demasiado calor para implementarmos qualquer decisão que tenhamos tomado e o povo português suspende as suas atividades até depois do final de agosto. A partir de setembro é quando acordamos para o momento de concretizarmos aquilo que tínhamos planeado fazer.

Há cada vez mais portugueses que olham para o setor imobiliário como fonte de investimento e, por isso, muitas vezes é no final do ano que percebemos que há a capacidade, por um lado, e por vezes a necessidade de se fazer um outro investimento, sobretudo para aqueles que estão a fazer, e são cada vez mais, investimentos não a título pessoal, mas também por via de empresas.

Por isso, o final do ano é tradicionalmente um bom período para ajustar balanços e o setor imobiliário tem sido cada vez mais procurado para efeitos de investimento. Nem sequer temos, infelizmente, o mercado de arrendamento que funcione assim tão bem para que seja ainda mais atrativo para que as pessoas apostem no investimento.

Sabemos também que, nos últimos anos, tem havido muitas mudanças legislativas que muitas vezes têm efeito no início de um determinado ano ou acabam determinados tipos de benefícios fiscais associados à mediação, o que faz com que haja um acelerar desses investimentos no final do ano.

Os portugueses continuam a ser a principal nacionalidade a comprar casa?

O cliente português continua a ser o grande comprador, sobretudo no nosso segmento, que é o residencial. Temos uma divisão de luxo, mas não nos movemos maioritariamente nesse segmento. Diria que 95% do nosso volume de faturação ainda é de clientes portugueses.

Mesmo que cerca de 90% seja de clientes portugueses, tem havido um aumento dos clientes estrangeiros e, dentro deste subconjunto, nos últimos dois anos, um crescimento muito significativo de clientes norte-americanos, fruto da instabilidade política no país e também porque, ao nível da KW, sendo uma rede americana, temos uma grande facilidade de entrar em contacto com os nossos consultores americanos.

Por isso, tem havido um grande aumento de interesse por parte dos clientes norte-americanos, que se iniciou, se calhar, há quatro ou cinco anos numa primeira vaga, mas que era muito em linha com aquilo que era o cliente típico estrangeiro, independentemente da sua nacionalidade.

Ou seja, pessoas à procura de investimentos ou de casas de férias e que, neste momento, sobretudo no pós-Covid e pós-Trump, vemos também a classe média americana à procura, ou de emigrar para o nosso país, ou a transferir parte da sua riqueza, das suas poupanças, dos seus investimentos imobiliários para Portugal, tendo em conta a instabilidade e a menor rentabilidade que estimam ter nos próximos anos naquele país.

Como olha para essa mudança?

Tem sido um movimento interessante de assistir. Começou com o cliente tradicional, de gama alta, digamos assim, para agora vermos muito cliente americano da classe média também a entrar no mercado português, mesmo para habitação permanente e também a contribuírem para o aumento do negócio da intermediação de crédito, porque muitos deles também recorrem a financiamento em Portugal. É mais vantajoso, apesar de o processo ser mais moroso, mas acaba por haver condições favoráveis também para o cliente estrangeiro.

Portanto, sem dúvida, o crescimento dos clientes americanos é acompanhado também, nesta fase, por franceses e brasileiros, seguidos por nacionalidades que já tradicionalmente investiam no mercado português, nomeadamente ingleses, alemães, angolanos e alguns clientes do Leste. Mas, nos últimos anos, claramente, há uma grande vaga de clientes franceses e, sobretudo, americanos.

Em que regiões do país têm sentido maior pressão de procura?

Neste momento, temos dois movimentos diferentes. Portugal continua a sofrer ainda de um grande mal de centralismo. A Grande Lisboa e o Grande Porto continuam a ter uma enorme procura, mesmo que tenhamos sentido, sobretudo no pós-Covid, que as áreas à volta da Área Metropolitana de Lisboa e da Área Metropolitana do Porto estão a ter um franco crescimento na procura e, consequentemente, também nos preços.

Essa dinâmica mantém-se, mas tem vindo a desacelerar também, porque estamos a assistir a uma inversão na posição de uma parte relevante das empresas nacionais relativamente ao teletrabalho.

Há algum retrocesso face àquilo que vivemos, nomeadamente nos dois ou três anos a seguir ao Covid, em que cada vez mais empresas tradicionalmente com sede em Lisboa e Porto estão a regressar ou a ter políticas onde, se calhar, o trabalho presencial já tem maior peso do que o remoto. Isso está a criar uma pressão acrescida nesta crise habitacional.

Que tipologias são mais procuradas?

Esse é outro dos desafios que também cria grande pressão sobre a habitação neste momento, que é o aumento ou a mudança daquilo que é a família portuguesa tradicional.

O parque habitacional português foi criado a pensar na família tradicional e, neste momento, existe uma grande pressão porque há cada vez mais projetos monoparentais, taxas historicamente baixas de natalidade, taxas historicamente altas de divórcios e taxas historicamente baixas de casamento. Diria que, neste momento, há uma maior pressão na procura por tipologias mais pequenas.

Sentiram um aumento na compra de casa por parte dos jovens com menos de 35 anos devido aos benefícios fiscais?

Notámos um aumento muito significativo. É mais uma alteração legislativa que cria a incerteza. Depois, ainda por cima, havia o tema da garantia do Estado, que demorou muito tempo a ser aprovada e, portanto, criava aqui muita incerteza.

Como prestamos dois tipos de serviço, um de acompanhamento do lado da mediação, mas também temos a possibilidade de acompanhar via intermediação de crédito, esse processo junto dos clientes, tivemos muitos casos a recorrer à mediação depois dessa medida do Governo.

Ainda sentimos essa procura neste momento. Na minha perspetiva, para a mediação, foi bom o aumento de procura num segmento em que tradicionalmente ela não existia.

Para aquilo que é um problema maior do país, que é a crise do acesso à habitação, foi uma má medida, na minha opinião, porque, num cenário de escassez de oferta, qualquer medida de concentração de procura e aumento da mesma teve o efeito que a maior parte dos analistas e das pessoas ligadas à mediação esperavam, que foi um aumento dos preços.

É uma medida que não foi necessariamente aproveitada por aqueles para quem eu imagino que ela tenha sido desenhada, que era o jovem desfavorecido sem condições para aceder ao crédito de outra forma.

O que aconteceu muitas vezes foi uma extraordinária medida para que pais que tivessem algum capital para investir pudessem beneficiar de condições favoráveis para resolver um problema aos seus filhos. Não foram necessariamente as classes que estávamos à espera que fossem beneficiadas que verdadeiramente acabaram por ser impactadas.

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