Ser confundível com o PSD é um handicap apontado ao CDS: Porquê votar no CDS e não no PSD? Não se opõem ambos ao socialismo e às esquerdas? Não propõem ambos reduzir impostos? Não pretendem ambos uma máquina estatal mais eficaz e eficiente? O que distingue afinal estes partidos? O desvalorizar do factor ideologia conduziu a estas e outras questões, o que a par de erros de casting cometidos em vésperas de eleições contribuiu para o desastre nas legislativas.
Num conhecido artigo, Richard Robinson da Universidade de Birmingham, resume alguns factos interessantes sobre a história do CDS: a 19 de julho de 1974, “(…) três dias depois de o episcopado ter tornado pública uma importante pastoral sobre a contribuição dos cristãos para a vida social e política”, o partido conheceu a luz do dia tornando-se imediatamente num “dos principais candidatos a representar o movimento democrata-cristão internacional em Portugal”.
Assim, “como forma de identificação ideológica, o CDS anunciou ser um «partido centrista» desejoso de contribuir para «uma sociedade mais justa onde as pessoas [pudessem] ser tratadas em pé de igualdade, sem discriminações, nem privilégios». A favor do Estado-providência e da família, do desenvolvimento económico e de um Estado democrático forte”, sendo o programa do partido “repassado, do princípio ao fim, por uma nítida inspiração cristã”[1].
Não obstante acolher outros pensamentos, o CDS possui uma matriz democrata-cristã. As razões da sua existência incluem, segundo os seus estatutos, “propor para a sociedade portuguesa um modelo assente nos valores éticos, sociais e democráticos do humanismo personalista de inspiração cristã” e “promover a formação cívica e o esclarecimento e doutrinação política dos cidadãos, difundindo o ideário democrata-cristão” (artigo 2.º, alíneas b e f dos Estatutos do CDS).
É esta ideologia – a do CDS –, que o novo líder parece querer expor como bandeira. Para alguns comentadores, Francisco Rodrigues dos Santos pretende uma viragem “radical à direita”, dado que é contra o aborto, contra a eutanásia, contra o casamento entre pessoas do mesmo sexo, contra a adopção de crianças por parte de pessoas do mesmo sexo e contra a ideologia de género nas escolas. Mas sendo ele um democrata-cristão era suposto defender o contrário? Recordo que a democracia cristã se inspira na Doutrina Social da Igreja que por seu turno defende, de forma intransigente, a vida e os valores da família[2].
Nas aulas sobre o tema da liderança costumo referir que os verdadeiros líderes não são seguidos pelo facto de deterem poder. As multidões seguem-nos porque acreditam e comungam das suas ideias. Goste-se, ou não, o pensamento de Francisco está em linha com a matriz ideológica do seu partido e é precisamente isso que está a desagradar a quem defende um catch-all party. Ainda há esperança para o CDS.
O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.
[1] ”Do CDS ao CDS-PP: o Partido do Centro Democrático Social e o seu papel na política portuguesa” (Robinson, 1996, Análise Social, Vol. XXXI (138) (4.º), p. 972).
[2] Sobre a defesa da vida, a Encíclica “Evangelium Vitae” de São João Paulo II é clara: “tudo quanto se opõe à vida, como seja toda a espécie de homicídio, genocídio, aborto, eutanásia e suicídio voluntário (…) são infamantes”. Já o documento da Congregação para a Doutrina da Fé, intitulado “considerações sobre os projetos de reconhecimento legal das uniões entre pessoas homossexuais”, assinado por Joseph Ratzinger (futuro Papa Bento XVI) e aprovado por São João Paulo II, reflecte a posição da Santa Igreja sobre o tema: “Se todos os fiéis são obrigados a opor-se ao reconhecimento legal das uniões homossexuais, os políticos católicos são-no de modo especial, na linha da responsabilidade que lhes é própria”.