A 20 do mês passado, quando as temperaturas rondavam os 38 graus, seis condutores de autocarros de Nantes foram proibidos de usar calções, apesar dos ditos autocarros não terem ar condicionado e as temperaturas ao volante se aproximarem dos 50ºC. Passaram a usar saias, em protesto. Antes disso, no dia 19 de junho, Joey Barge, trabalhador de um call center em Buckinghamshire, apresentou-se de calções e foi mandado para casa, para vestir uma indumentária mais adequada; voltou de saia preta e roxa, no mais puro estilo de “ir para o call center vestido de call girl”. Em Exeter, trinta rapazes duma escola trocaram o uniforme por calções e foram repreendidos; apareceram de saias no dia 22, o que um deles classificou de “quite refreshing”.
Não fossem as situações criadas, isto seria um fait divers, algo até ridículo quando a saia foi a segunda peça de vestuário masculino da História, só sendo precedida pela tanga, aquela coisa usada por todos, de banhistas a artistas, incluindo os mais exímios destes últimos, os políticos. Aliás, junto com a túnica era a peça de vestuário de gregos e romanos, usada com orgulho e como sinal de status social. Só foi destronada pelas calças por ser pouco prática para andar a cavalo. E já agora, que dizer dos saltos altos, eles próprios também muito masculinos até tempos recentes – no Oeste americano a bota de salto alto foi comum até finais do século XIX. Se dúvidas houvera, veja-se o célebre quadro de Luís XIV, nos seus belos sapatos de salto alto vermelho.
No espaço de uma semana o post inicial de Barge teve 6.600 likes. No mesmo período, o vídeo dos motoristas franceses foi visto mais de 334 mil vezes. Tivemos este ano a Grande Rebelião dos Machos de Saias de 2017, que ultrapassou fronteiras, passando por cima de Brexits e afins. Este foi um curioso momento de coesão europeia, sem paralelo, e um grande sucesso. Em Nantes, logo no dia 22 a direção da empresa autorizou o uso de bermudas escuras ou beije, e o calção vai integrar a farda da empresa para os dias de canícula; a empresa de Barge já autorizou o uso de calções longos, pretos, navy ou beije; e a escola de Exeter já autorizou, com efeito no próximo ano, o uso de shorts.
Agora queria ver os nossos deputados, tão ciosos da igualdade, a aprovarem uma lei no Parlamento como a Lei da Paridade, a obrigar a que pelo menos um terço deles, deputados, tenha que andar de saias e salto alto. Se não o fizerem, só merecem um qualificativo: maricas!
Nota biográfica: Hemp Lastru (n. 1954, em Praga) é sobrinho neto de Franz Kafka. Democrata convicto, ativista e lutador político, é preso várias vezes pela polícia secreta checoslovaca, tendo sido sentenciado em 1985 ao corte de uma orelha sob a acusação de “escutar às portas”. Abandona a política em 1999, deixando Praga para residir em Espanha. Mudou-se para Portugal em 2005 porque “gostaria de viver num país onde os processos são como descrevia o meu tio-avô nos livros.”