Em 2017, o Enviado Especial americano Brett McGurk referia-se à situação em Idlib do seguinte modo: “A província de Idlib é o maior santuário da Al Qaeda desde o 11 de setembro, ligado diretamente a Ayman al Zawahri. Isto é um grande problema”. Na verdade, McGurk não disse nada que não se soubesse. Era do conhecimento geral o apoio e proteção dados pela Turquia aos grupos islamistas que combatiam e combatem o regime de Assad. Era assim em 2017, e continua a ser hoje.

O Hayat Tahrir al-Sham controla a província de Idlib onde montou uma rede de tribunais da sharia. Ergodan não deixou de sonhar com a queda do regime alauita e a sua substituição por um regime sunita dominado pela Irmandade Muçulmana. Por isso, impede o Exército sírio de recuperar o controlo da região.

Não deixam de ser curiosas as reações de alguns atores internacionais a esta situação. Depois de ameaçarem a Turquia com sanções por adquirir mísseis S-400 à Rússia, e retirarem Ancara do programa de desenvolvimento do caça supersónico F-35, os EUA vêm agora “prestavelmente” fornecer intelligence às forças turcas a operar em Idlib, e apoiar politicamente a sua atuação. O Secretário de Estado Mike Pompeo afirmou que “a Turquia tem o pleno direito de atuar de modo a proteger os seus interesses nacionais na Síria, e que esse direito lhe advém daquilo que a Rússia e o Irão estão ali a fazer”.

Estas afirmações são muito graves. Esquecendo-se que, ao contrário dos EUA, a Rússia e o Irão foram convidados por Damasco, Pompeo faz a apologia da violação do Direito Internacional. Segundo ele, é legítimo um país atacar outro, mesmo quando este não representa uma ameaça. Os EUA foram para a Síria ajudar os curdos sírios, inimigos da Turquia, a combater o Estado Islâmico, mas não têm agora pudor em apoiar um Estado que protege a Al Qaeda. Parece que para Mike Pompeo existem dois tipos de terrorismo jiadista: o bom e o mau.

Mas, se para Pompeo, a Turquia está no pleno direito de atuar na Síria para proteger os seus interesses, em que é isso diferente do comportamento da Rússia na Ucrânia ou na Geórgia? Não está também a proteger os seus interesses nacionais? Será que existe um Direito Internacional bom e outro mau? será que o Direito Internacional serve apenas quando convém, como no caso dos tribunais penais ad-hoc?

As declarações do Secretário-Geral da NATO Jens Stoltenberg levantam-nos igualmente muitas interrogações: “Nenhum Aliado sofreu tanto com os ataques terroristas [como a Turquia], e nenhum outro recebeu tantos refugiados”. Será que alguém lhe trocou as speaking notes? Para além dos curdos, que é outra questão, a Turquia não sofreu ataques terroristas.

Pelo contrário, ajudou terroristas a preparar ataques, deu-lhes salvo-condutos, apoio logístico, equipamento e treino militar, e participa em operações militares conjuntamente com eles. Por outro lado, aqueles que foram encaminhados pelas autoridades turcas para a fronteira com a Grécia eram, na sua maioria, migrantes económicos vindos de outras paragens e não refugiados oriundos da Síria.

Metem dó as ambiguidades, os argumentos reunidos à pressa e a falta de coragem para expor e condenar o comportamento trapezista do Sultão. A ausência de uma estratégia esclarecida e uma posição de subserviência não dignificam ninguém.