Em 2023 as demonstrações financeiras das companhias de seguros já refletirão a adoção da IFRS 17. Perante a magnitude das alterações em causa, será que vamos ter que esperar por 31 de dezembro de 2023 para saber que regime fiscal aplicar?

Parece ser consensual que a IFRS 17, norma contabilística que determina novas regras para o reconhecimento, mensuração e divulgação dos contratos de seguro e de resseguro, acarreta grandes desafios para a grande maioria das entidades que comercializem aqueles contratos, encontrando-se em curso, embora em diferentes estágios de concretização, os respetivos projetos de implementação.

Perante este novo referencial contabilístico, o qual pode conduzir a diferenças no reconhecimento dos resultados, surgem, naturalmente, questões sobre os impactos fiscais associados quer à própria transição quer ao business as usual.

Com efeito, decorre do Código do IRC que o lucro tributável é constituído pela soma algébrica do resultado líquido contabilístico e das variações patrimoniais ocorridas no mesmo período, apurados com base na contabilidade e eventualmente corrigidos com base nas regras previstas nesse código. Determina também o Código do IRC que a contabilidade deve estar organizada de acordo com a normalização contabilística e outras disposições legais em vigor para o respetivo sector de atividade.

Ora, a partir de 2023, a “normalização contabilística” em vigor para o sector segurador refletirá a aplicação da IFRS 17, ou seja, será este o referencial contabilístico aplicável aos contratos de seguros. Neste sentido, é fundamental que os tax managers comecem por se focar na análise das alterações impostas pela norma ao nível das demonstrações financeiras, sendo este um passo prévio fundamental para se poder equacionar como se poderão traduzir essas mesmas alterações em sede de IRC. Sem prejuízo deste exercício, e não existindo ainda, tanto quanto sabemos, qualquer orientação por parte da Autoridade Tributária (AT) sobre esta matéria, o passo seguinte exige que se simulem diversos cenários. Considerando apenas cenários extremos, podemos equacionar a possibilidade de todos os impactos decorrentes da adoção da IFRS17 virem a ser considerados fiscalmente relevantes, até ao cenário em que nada relevará para efeitos fiscais.

Importa assim assegurar a inclusão da variável fiscal nos projetos de implementação em curso, até porque não nos parece exequível nada fazer e aguardar por alguma alteração à lei e/ou que a AT torne pública a sua posição sobre o tema. A este respeito, não podemos deixar de recordar que quando em 2008 entrou em vigor o Plano de Contas para as Empresas de Seguros (PCES), o decreto-lei que veio estabelecer o regime transitório para adaptar as regras de determinação do lucro tributável previstas no Código do IRC e demais legislação complementar à então nova regulamentação contabilística apenas foi publicado no dia 15 de dezembro de 2008. Acreditamos que ninguém vai querer reviver semelhante cenário…