Toda a minha vida vivi rodeado de mulheres. No seio da vida familiar, em primeiro lugar, com mulheres que trabalhavam e prosseguiam as suas carreiras profissionais. Mulheres essas que sempre foram determinadas, focadas e competentes. Mulheres que educaram os filhos e geriram as suas carreiras, amiúde com os cônjuges ausentes, em determinada altura das nossas vidas fruto da guerra colonial, e mais tarde por razões de ordem profissional.

Toda a minha vida conheci casais em que marido e mulher trabalhavam e contribuíam de forma igual para as decisões comuns, fossem essas relativas a investimentos (o caso da aquisição de habitação própria ou de automóvel, por exemplo), à educação dos filhos, a poupanças ou quaisquer outras. Talvez no final dos anos 1960, e início dos anos 1970, esta normalidade que pessoalmente vivi não fosse a de muitas famílias portuguesas, mas era a minha.

Felizmente este é hoje o padrão. Homens e mulheres estão, em plena igualdade, nos processos educativos, no mercado de trabalho e no desempenho de profissões, quaisquer que elas sejam. Uma realidade em que as mulheres participam de forma decisiva no mercado de trabalho, com taxas que só encontram paralelo nos países nórdicos. Estou grato ao meu país por ser assim. E por ter filhos que aqui vivem, crescem, estudam e que desejo que um dia venham também a aqui trabalhar.

Existe, contudo, ainda espaço para melhorar e para que esta paridade tenha outras condições que permitam conciliar mais ainda o trabalho e a família. Por isso, ano após ano, procuro contribuir, junto dos grupos parlamentares, e no âmbito da negociação colectiva com os empregadores, para que existam condições que permitam que as carreiras profissionais e o mundo do trabalho em geral não se façam com o sacrifício das famílias.

O trabalho remoto, os horários flexíveis, a majoração de licenças de paternidade e maternidade, a rede de creches e deduções fiscais, o acompanhamento às reuniões escolares – estas são algumas das ‘batalhas’ que vamos introduzindo nos instrumentos de regulação colectiva de trabalho. Ano após ano, num esforço nunca completo, tanto para os pais como para as mães.

Contudo, apesar deste progresso, um certo espírito marialva persiste ainda na sociedade portuguesa. Um espírito que não pertence, nem poderia pertencer, a qualquer tipo de cultura ou tradição digna do século XXI.

Sejamos muito claros. A violência sobre as mulheres, no âmbito doméstico ou profissional, no caso do assédio, nunca poderá ser desculpada por um qualquer entorno cultural. A violência e a barbárie, seja noutros territórios e geografias, seja nas nossas comunidades, não são admissíveis. Já basta o flagelo do alcoolismo, que tanto potencia a violência e outros comportamentos deploráveis, e cujo combate nos deve mobilizar a todos. Não precisamos de ajudas supostamente derivadas da tradição. Por tudo isto, igualdade de género, sempre!

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.