O mundo digital encaixa mal no quadro fiscal que foi desenhado para taxar os fluxos económicos e os processos de criação de valor próprios do mundo físico. Ou encaixa demasiado bem, se em lugar de privilegiar o interesse comum quisermos privilegiar o interesse dos acionistas dos gigantes da Internet.

A taxa média de IRC das empresas que integram o universo digital é de 8,5%, menos de metade da taxa média de 20,9% que suportam as empresas europeias. Como consequência desse desfasamento, os estados europeus perdem anualmente um bilião de euros em impostos, o equivalente ao PIB de Espanha. Não surpreende, por isso, que o Ecofin tenha proposto recentemente um novo imposto sobre as receitas digitais a favor do país em que são geradas.

O que realmente surpreende é que a sempiterna discussão sobre a taxação dos gigantes de Internet tenha sido, até à data, inconsequente. A única justificação que consigo encontrar para esta situação é o medo que os políticos têm de ser castigados nas urnas por taxar o acesso gratuito a esse novo mundo de entretenimento social digital. Mas, neste momento, começa a estender-se a perceção de que a transformação digital, por via da robótica e da inteligência artificial, é uma ameaça real para o bolso de muitos empregados.

A dissonância narrativa entre o paraíso digital prometido pelos gigantes da Internet e a constatação de que a atual onda de crescimento económico não permite recuperar as condições laborais prévias à crise, porque o desenvolvimento tecnológico parece diluir qualquer pressão inflacionista, está a mudar a nossa perceção sobre as vantagens deste novo mundo. Já não é verdade que os “digitalistas” vão para o céu e os “analogistas” vão todos para o inferno.

Para países como o Japão, que têm uma taxa ínfima de natalidade, uma população educada e uma cultura impermeável à imigração, a robotização é indispensável para a sobrevivência. Mas, uma vez desenvolvida e testada, essa tecnologia deverá chegar rapidamente às economias onde a imigração e o desemprego são muito superiores e em que os processos de digitalização serão percebidos como mais inquietantes.

Por isso, não é descabido pensar, por exemplo, num imposto transitório para os robôs para financiar a requalificação dos trabalhadores mais afetados pela transformação digital. Ou, num outro plano, garantir uma renda básica para os utilizadores que fornecem os seus dados gratuitamente nas redes sociais.

Inauguraríamos, assim, a nova categoria dos impostos bem-vindos.