A primeira implicação do chumbo da proposta de orçamento para 2022 e das eleições subsequentes é a incerteza política que as rodeia. É muito difícil imaginar que se possa criar uma maioria parlamentar estável na próxima legislatura, que, por isso, dificilmente durará quatro anos.

Se houver uma maioria de esquerda, teremos um cenário semelhante ao actual, com parceiros recém desavindos, entre os quais um acordo será difícil, pelo menos se se mantiverem os actuais protagonistas.

Se a maioria for de direita, haverá o obstáculo do Chega, que, mesmo fora do governo, também se pode revelar um parceiro pouco previsível e ainda menos confiável.

Se não se conhece a solução governativa, por maioria de razão não se consegue prever o novo orçamento, que poderá envolver muitas contrapartidas. Deve-se dizer que a não aprovação da proposta deste governo nos liberta das cedências excessivas que este se preparava para fazer para “comprar” os votos favoráveis do PCP.

O mais provável é que toda esta indecisão conduza ao adiamento de decisões, sobretudo do lado das empresas, sendo possível que alguns investimentos, sobretudo os mais dependentes de autorizações ou apoios estatais, sejam adiados.

Enquanto o novo orçamento não for aprovado, será aplicado o orçamento aprovado para 2021, em regime de duodécimos. A generalidade dos impostos mantém-se, a autorização de endividamento também, o que, prevendo uma diminuição do défice público, não será problemático.

É possível que haja dificuldade de executar o PRR, já que há um conjunto de marcos e metas, cujo cumprimento poderá ser colocado em causa, sobretudo as de caracter legislativo, quer pelas limitações de um governo em gestão, quer pela dissolução do parlamento.

É provável que o adiamento de decisões de investimento e também de consumo, bem como a dificuldade com o PRR, conduzam a algum abrandamento do processo de retoma em curso, que já está a sofrer com o arrefecimento internacional, devido à subida dos preços da energia e às dificuldades na obtenção de componentes industriais.

Como positivo, podemos assistir à queda de alguns impostos. Os que foram aprovados para vigorar em 2021, ainda que venham de trás, deixam de estar em vigor, tais como o adicional de ISP (5,4 cêntimos por litro de gasolina e de 5,9 cêntimos por litro de gasóleo), adicional de IUC e as contribuições sobre os sectores bancário e energético (125 milhões de euros).

Em relação à despesa pública, fica em causa o aumento dos funcionários públicos, embora o novo governo possa fazer uma actualização salarial com efeitos retroactivos. O mesmo se deve passar com o aumento extra das pensões e os recursos adicionais para o SNS, que poderá recorrer, entretanto, a endividamento.

Será excessivo concluir que o chumbo do orçamento foi negativo, até porque o preço que o governo se preparava para pagar era excessivo, para além de estarmos a beneficiar de uma aceleração do ciclo político, após o esgotamento de uma solução sem visão estratégica e com fracos resultados.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.