É enorme a iliteracia digital em Portugal, mas não é uniforme. Canalizadores e taxistas sabem mais de marketing digital que responsáveis pelo marketing e comunicação de médias e grandes empresas. Ao contrário daqueles – empresários em nome individual ou donos de microempresas – estes não estarão motivados ou não quererão sair da sua área de conforto. Talvez nem sequer haja plano de marketing anual e respetivo orçamento.

A empresa poderá não ser sua, têm poucas responsabilidades e poder de decisão porque não houve delegação, os donos da empresa provavelmente estão inseguros ou ainda não perceberam que é vital a presença digital – mas têm emprego. Também se nota resistência e preguiça em aprender como explorar a tecnologia digital para expandir negócios, seja através de técnicas de search engine optimization (SEO), seja através de publicidade paga no Google. Marketing digital é hoje indispensável.

A Web existe há 29 anos, mas muitas e muitas empresas portuguesas, pequenas, médias e grandes, têm websites miseráveis, uma absoluta vergonha. É muito barato ter um website decente. É chocante que os responsáveis dessas empresas, três décadas passadas, não tenham ainda racionalizado que o website é a âncora de toda a atividade, é o cartão de visita instantâneo e mundial do grau de sofisticação comercial, industrial, tecnológico da empresa e, por extensão, do país.

Não quer isto dizer que têm de utilizar imagens 360º e artifícios que só complicam e atrasam a experiência do utilizador. O website tem de ter conteúdo bem formatado ao medium, ser simples, agradável e útil, ter bom gosto e disponibilizar rapidamente a informação que a maioria dos utilizadores procura.

Há uns vinte anos escrevi uma coluna intitulada “Em Louvor do Email”. É impressionante voltar hoje ao tema. A mesma fatal incompreensão sobre a Web persiste quanto ao email, uma tecnologia de comunicação cuja origem remonta aos anos 1960. O email e os produtos de comunicação por ele suportados, como newsletters, são desde há muito um veículo fundamental de comunicação com clientes e o mercado em geral. Basta verificar que nem o Facebook nem o Twitter dispensam o uso exaustivo e assoberbante do email para se fazerem lembrar.

A desconsideração pelo email radica num comportamento que vai mais fundo que a incompreensão da importância do digital. É vulgar responsáveis portugueses não responderem aos emails, como também é vulgar não darem seguimento a telefonemas e cartas, nem que seja para um simples mas simpático “não” – como fazia Emilio Botín, o fundador do Santander, que não deixava ninguém sem uma resposta.

Não é apenas uma questão de existência ou não de cultura de empresa. É mais vasto: é uma questão de cultura sócio-empresarial. Práticas comuns nas grandes e melhores empresas não têm correspondência generalizada entre micro, pequenas e médias empresas e, por vezes, mesmo entre as maiores. Cumprir agendas combinadas com outras pessoas não é frequentemente sentido como uma obrigação, enquanto esquecer o que se combinou é fácil ou propositadamente ignorado.

As agendas eletrónicas não são utilizadas para garantir que nem eles nem os outros se esquecem do encontro ou da conversa, mesmo que só pelo telefone. Na verdade, o verbo “combinar” tem pouco valor em Portugal. Noutros países assume o valor de um contrato. Aqui é só uma outra maneira de dizer “OK pá”. Para não falar da pontualidade. Esse símbolo sagrado de organização e respeito pelos outros não é venerado por muitos portugueses.

Estes comportamentos desleixados e desrespeitadores são muito notados pelos estrangeiros, classificam mal a cultura do país de modo generalizado e indelével, e têm um impacto muito negativo nas relações comerciais. Mais e mais pessoas, muitas delas supostamente gestores, precisariam de frequentar escolas de gestão para aprenderem estas coisas básicas relativas a comportamentos, para além, evidentemente, de outras mais avançadas, por exemplo a nível financeiro, organizacional, de branding e marketing.

Nessas escolas aprende-se a diferença entre atitude (um estado de espírito), que quase todas as pessoas dizem ter em relação aos mais diversos assuntos, e comportamento (uma ação que confirma ou desconfirma a sinceridade da atitude).

Há boas escolas de gestão em Portugal. Não são baratas, por isso não estão ao alcance de muitos que gostariam e precisariam de as frequentar, o que tem certamente impacto negativo na baixa qualidade da gestão de muitas pequenas e médias empresas. Boa parte dos alunos destas escolas portuguesas, dos quais muitos são estrangeiros, irão encontrar emprego em grandes empresas nacionais ou estrangeiras.

Há nada menos que três escolas portuguesas no ranking das 90 melhores escolas de gestão do mundo: Católica Lisbon School of Business and Economics (nº 42), Nova School of Business and Economics (nº 62) e Porto Business School (nº 75). No ranking de MBA, The Lisbon MBA, uma parceria da Universidade Católica com a Universidade Nova de Lisboa, está em 80º lugar. É positivo a presença de pelo menos uma escola portuguesa em tão concorrido e influente ranking, mas não deixa de ser dececionante que tenha havido uma descida de lugares relativamente a 2016.

No ranking do Financial Times dos 50 melhores MBA com foco no empreendedorismo, revelado há dias, não há nenhuma escola portuguesa. Creio que este tipo de formação se irá expandir, tendo em conta que começa a ser comum que, mesmo nos EUA, os alunos saídos destas escolas procurem, como é normal, emprego numa grande empresa, mas que constituam também uma startup que gerem em paralelo. Outros, passados alguns anos numa grande empresa, decidem sair e constituir uma startup.

Enquanto algumas escolas formais fomentam o empreendedorismo, como a UNL, muitos politécnicos ensinam disciplinas que poderiam integrar um currículo de gestão. Por outro lado, há municípios que desenvolveram planos estratégicos com critérios por eles definidos para apoio ao empreendedorismo, desde logo no âmbito do programa Portugal 2020, e que responderão a avaliações locais e regionais ou de cluster, mas outros mantêm iniciativas aparentemente ad hoc, utilizando recursos financeiros dos contribuintes para apoio à criação de novas empresas.

Repare-se na Start Up Lisboa, uma associação sem fins lucrativos do Município de Lisboa, Montepio e IAPMEI fundada em 2011. A informação divulgada centra-se em grandes números que pouco dizem e que precisam de validação. Afirma-se que, desde 2012, apoiou a criação de 280 startups e que está na origem da criação de 1.500 postos de trabalho e de 80 milhões de euros captados em investimento. Para além do espaço da chamada incubadora, faz a gestão do Fundo Start Up Loans, que financia novas ou empresas existentes até 45 mil euros.

Não sei se é possível saber quais são essas startups. Embora o site seja prolixo em fotografias dos funcionários municipais que integram a Start Up Lisboa, desde o CEO às chefes de limpeza, não encontrei informação que se assemelhe a um plano estratégico nem a um relatório e contas, como por exemplo a InvestBraga, uma parceria que inclui uma instituição académica – a Universidade do Minho – e em que a ligação à indústria localizada no município é omnipresente. (Só encontrei R&C de InvestBraga até 2016 – deixaram de o produzir? Se sim, é mau sinal).

Era interessante e devido aos contribuintes que a CML facultasse fácil acesso aos dados sobre resultados concretos das pessoas e empresas apoiadas até agora. Por exemplo, quem são, quais os setores de atividade, qual a ligação à indústria e serviços localizados no município, o volume de negócios, break-even, retorno, patentes, internacionalização, etc., conseguidos pelas empresas apoiadas.

O próprio conceito de startup deveria ser revisto. Segundo a mitologia, startup é sinónimo de jovem. Este foco nos jovens não é confirmado pela ciência atual como condição sine qua non para o sucesso. Certamente que os mais novos têm ideias novas, são rápidos e têm energia – mas falta-lhes experiência, que nem o mentoring pode compensar.

Um estudo recente publicado pelo KelloggInsight, feito nos EUA, com base em dados reais de registos de empresas, revelou que a maior parte das startups tecnológicas são criadas por pessoas com idade média de 45 anos, e que uma pessoa com 50 anos tem 1,8 vezes mais probabilidades de começar uma empresa de topo que uma pessoa de 30 anos – em particular se a startup for na mesma área em que o cinquentenário desenvolveu a sua atividade anteriormente.

As pessoas na casa dos 20 anos são as que têm menor possibilidade de sucesso, mas estes jovens serão certamente ótimos empregados para as startups fundadas pelos mais velhos, onde poderão adquirir experiência. Os autores do estudo apresentam várias hipóteses sobre a continuada misteriosa propensão do capital de risco em apostar maioritariamente em empresas fundadas por jovens. Reconhecem não haver uma boa explicação.

O problema dos canalizadores e taxistas que, através da prática, adquiriram competências de marketing digital, é não terem capacidade humana e organizacional para responder ao inevitável aumento da procura. Muitas destas empresas são um “one man show. A  expansão só poderia advir de consolidação com concorrentes, mas essa é uma via que têm dificuldade em admitir. A consolidação de milhares de micro, pequenas e médias empresas para aquisição de escala é um problema por resolver.