A recente decisão do Tribunal Constitucional (TC) de considerar inconstitucional o Adicional de Solidariedade sobre o Setor Bancário (ASSB) levanta questões complexas e controversas.

Este imposto, instituído em 2020 para ajudar a financiar a Segurança Social durante a pandemia, rendeu aos cofres públicos cerca de 180 milhões de euros em cinco anos. No entanto, os recentes acórdãos do TC colocam em risco a continuidade desta contribuição, por alegada violação dos princípios da igualdade e da capacidade contributiva.

 As decisões do Tribunal Constitucional

O Tribunal Constitucional considerou que o ASSB viola o princípio da proibição da retroatividade dos impostos, uma vez que foi aplicado retroativamente aos saldos dos bancos do primeiro semestre de 2020.

Além disso, dois acórdãos também declararam o imposto inconstitucional por violar os princípios da igualdade e da capacidade contributiva. Estes princípios são fundamentais no sistema tributário, pois visam garantir o tratamento justo e equitativo de todos os contribuintes.

Apoio aos bancos durante a crise

A decisão de declarar o ASSB inconstitucional surge num contexto em que os bancos têm apresentado lucros significativos. Este cenário contrasta fortemente com o período da crise económica, quando os contribuintes foram chamados a “salvar” várias instituições bancárias.

Entre 2008 e 2021, o Estado português gastou cerca de 30 mil milhões de euros em apoios ao setor financeiro, resultando num saldo negativo de 22 mil milhões para os cofres públicos.

Este apoio foi fundamental para evitar o colapso do sistema financeiro, mas deixou um gosto amargo nos cidadãos, que viram os seus impostos serem usados para resgatar bancos que, posteriormente, voltaram a lucrar, nomeadamente, com as comissões bancárias que cobram aos seus clientes.

 As decisões

Explicar estas decisões aos cidadãos não é tarefa fácil.

A indignação é compreensível, especialmente quando se considera que os bancos, que foram resgatados com dinheiro público, agora se veem livres de uma contribuição adicional destinada a financiar a Segurança Social.

No entanto, é importante destacar que a decisão do TC se baseia em princípios constitucionais que visam proteger todos os contribuintes, incluindo os bancos, de medidas fiscais injustas e arbitrárias.

Os princípios da igualdade e da capacidade contributiva são pilares do nosso sistema tributário.

A igualdade tributária garante que todos os contribuintes sejam tratados de forma equitativa, enquanto a capacidade contributiva assegura que os impostos sejam proporcionais à capacidade de pagamento de cada um.

A retroatividade dos impostos, por outro lado, é uma prática que contraria a segurança jurídica e a previsibilidade que os contribuintes devem ter em relação às suas obrigações fiscais.

O futuro do financiamento da Segurança Social

Com a possível queda do ASSB, surge, mais uma vez, a questão de como financiar a Segurança Social de forma sustentável. A criação de impostos específicos para setores que beneficiam de isenções e de benefícios fiscais, como o setor bancário, pode ser uma solução, desde que respeite os princípios constitucionais.

Alternativamente, o Governo pode considerar outras formas de aumentar a receita, como a revisão das isenções fiscais ou a implementação de novas políticas fiscais que sejam justas e equitativas para todos os contribuintes. As decisões do Tribunal Constitucional sublinham a importância de respeitar os princípios constitucionais na elaboração das políticas fiscais.

Embora possa ser difícil de aceitar, especialmente num contexto de lucros bancários elevados e de memórias recentes dos resgates bancários financiados pelos contribuintes, esta decisão sublinha a necessidade de um sistema tributário justo e equitativo. Como disse John F. Kennedy, “se uma sociedade livre não pode ajudar os muitos que são pobres, não poderá salvar os poucos que são ricos”.

Em última análise, a busca por um sistema tributário justo e equitativo deve ser um esforço contínuo, que respeite os princípios constitucionais e responda às necessidades da sociedade.