No passado dia 1, o Tribunal Constitucional (TC) julgou inconstitucional a norma da Resolução do Conselho de Ministros ao abrigo da qual foram decretados os isolamentos profiláticos de turmas inteiras em escolas por todo o país, enquanto vigorou o estado de calamidade no último ano.
Deste julgamento de inconstitucionalidade retiram-se três ilações.
Antes de mais, a ilação de que, no futuro, as autoridades públicas responsáveis deverão repensar a forma como se impõem restrições, sob pena de as mesmas – se necessárias – virem a ser prejudicadas por fenómenos de contestação ou desobediência civil. Com base nestas decisões, funda-se uma convicção legitimada de que ninguém deve aceitar ser privado da liberdade com base numa ordem de um delegado de saúde ou de um agente administrativo, caso essa decisão não tenha passado pelo Parlamento. Também não se exclui que, a manter-se este modo de atuar, o Estado seja colocado em posição de ter de ressarcir os danos que causar pela privação inconstitucional da liberdade.
Em segundo lugar, deveriam ser repensados os tempos de atuação do TC. Não obstante a intransigência com a defesa da liberdade assumida pelo TC nestes acórdãos, a verdade é que estes pecam por tardios e, assim, comprometem a sua própria utilidade. Estes acórdãos chegam num momento que é de alívio das medidas de restrição, permitindo a desvalorização do juízo de inconstitucionalidade pelo Governo.
Olhando, em geral, para a jurisprudência constitucional produzida em pandemia, nota-se que a lentidão processual impediu uma resposta constitucional forte, que obrigasse as autoridades públicas a rever a sua forma de atuar. Em 2020, por exemplo, o TC julgou por quatro vezes inconstitucional a norma contida no n.º 6 da Resolução do Conselho do Governo n.º 207/2020, de 31 de julho de 2020, emanada do Governo Regional dos Açores. Não obstante a Constituição estabelecer que “o Tribunal Constitucional aprecia e declara, com força obrigatória geral, a inconstitucionalidade ou a ilegalidade de qualquer norma, desde que tenha sido por ele julgada inconstitucional ou ilegal em três casos concretos”, certo é que isso não sucedeu. E se atendermos a que poderá demorar dois anos a fazê-lo – como contabilizou o Expresso no ano passado – podemos esperar que, se o fizer, a sua decisão será irrelevante. Chegará tarde de mais, após ter deixado desprotegidos os cidadãos, no período em que os seus direitos foram mais afetados.
Por último, também os cidadãos devem sentir-se interpelados por estes acórdãos. De tanto valorizar as preocupações de segurança e saúde, renunciámos aos mecanismos de defesa dos nossos direitos. Dos milhares de alunos que foram privados da sua liberdade com base em ordem administrativa inconstitucional, foram poucos os pais que se queixaram às instâncias competentes. Provavelmente, se tivesse havido uma maior mobilização e mais pedidos de habeas corpus, as próprias autoridades teriam sentido a necessidade de legitimação parlamentar. E, quem sabe, o próprio Tribunal Constitucional teria vencido a inércia e agido de forma mais expedita e consentânea com a proteção dos nossos direitos, liberdades e garantias.