Depois da crise das dívidas soberanas, cujas consequências a maior parte dos países europeus se confrontou, e confronta ainda, os assuntos económicos parecem ter permanecido de maneira mais duradoura na ordem do dia do agenda-setting. Há, de facto, uma dualidade mais perceptível nos últimos tempos, porque mais notada, entre o que é um Estado de Direito, por um lado, e a influência do e no mesmo por parte da economia privada, por outro. Ou seja, e por outras palavras, onde se tocam e situam aspectos como o sistema político e as respectivas políticas públicas emanadas pelo Estado e pela iniciativa privada.

Há, a este propósito, nas democracias ditas liberais, uma espécie de acordo tácito pouco conflitual entre o que serão as instituições políticas e a Economia, no seu todo. Claro está que a maior ou menor intervenção estatal, no que concerne aos “bolsos dos privados”, vai sendo algo mutável e não está, também, totalmente isenta de conflito. Todavia, a noção de que haverá uma certa interdependência com um distanciamento, dito aceitável, pelo bom senso, é geralmente bem acolhida.

Pode, no entanto, o cidadão mais atento dizer que os escândalos de ligações entre a política e a banca provam exactamente o contrário. E tem razão, mas espera-se, a bem da manutenção do estado das coisas, isto é, do Estado Democrático, que estas sejam, para nós, mais a excepção do que a regra. Ainda que o cepticismo deva guiar os nossos raciocínios, “deitar fora o bebé com a água do banho” nunca foi boa solução.

Quem se interessa pelo estudo dos factos económicos e sociais sabe que, historicamente, o mercado, ou, se preferirem, a Economia, em sentido lato, teve um papel importante e central no estabelecimento e manutenção dos países democráticos. Há um diálogo constante entre economia e política, incluindo na definição dos respectivos limites, e isso foi, quase sempre, positivo para as sociedades e para o seu desenvolvimento. Ainda que, como eu referi acima, haja nesta relação espaço para desvios, sendo os mesmos, por norma, se não ilegais, no mínimo pouco benéficos para a maioria da população.

Há pois, nesta relação entre instituições políticas e economia, lições a ser aprendidas, mesmo, e eu diria sobretudo, para países com um poder limitado – Portugal, por exemplo – que façam parte de quasi federações, como é o caso da União Europeia: um mercado comum pode ser uma bênção e uma maldição; o facto de haver mais níveis de controlo, porque mais instituições (nacionais e supranacionais) estão envolvidas, é sempre um procedimento moroso, ainda que mais capaz de identificar comportamentos desviantes, práticas de corrupção e usos indevidos de dinheiros públicos; mais concorrência, regulada cuidadosamente, e mais investimento, poderão ser a base de crescimento para novas áreas de inovação e de real benefício para a população.

E não, não estou a defender um mercado sem limites, que fique claro. Mas sei que quando nos colocamos no meio do campo de batalha, regra geral somos atingidos por balas de, pelo menos, dois lados.

A autora escreve de acordo com a antiga ortografia.