A Inteligência Artificial (IA) é um dos grandes desafios dos próximos anos. Dada a multiplicidade de consequências da IA, concentremo-nos no impacto sobre o emprego e o desemprego.

É previsível que a IA venha a substituir um conjunto de trabalhos que envolvem alguma inteligência, mas rotineira, gerando desemprego, bem como inúmeras outras perdas, que nem são fáceis de prever com o conhecimento de que dispomos neste momento. Também é expectável que sejam criados novos empregos, que poderemos reunir em três grupos: empregos em actividades actuais que exigem saber manejar com a AI; empregos em novas actividades, criadas pela própria IA; empregos gerados pela procura adicional que decorre do enriquecimento com a IA.

Estas mudanças suscitam algumas questões: o desemprego sectorial produzido pela IA será gerível ou demasiado rápido e demasiado concentrado em certo tipo de trabalhadores, determinadas regiões e determinados países? Teremos regiões devastadas, como há anos o Vale do Ave em Portugal e actualmente Detroit nos EUA? O número de novos empregos criados será suficiente para compensar o número de empregos destruídos? Ou teremos uma forte subida do desemprego?

Para facilitar a exposição, vou arbitrar alguns valores possíveis. A actual taxa natural de desemprego situa-se entre os 6% e os 7%, pelo que o desemprego está ao nível do possível. Com a IA, com o desencontro entre as qualificações entre os antigos empregos e os novos, é possível que a taxa natural de desemprego suba para próximo dos 10%. Para além disso, poderá não haver suficiente criação de emprego com a IA e a taxa de desemprego poderá subir para, digamos, 12%.

A diferença entre estes 12% e a nova taxa natural de desemprego é aquilo que se designa como desemprego conjuntural, que poderá ser resolvido com políticas monetárias e orçamentais. Dado que é muito provável que este problema ocorra em simultâneo na zona euro, o BCE poderá ajudar a resolver o essencial desta parte da questão, com descidas adicionais das taxas de juro, em conjunto com algumas medidas orçamentais muito direccionadas.

As medidas para fazer face ao aumento do desemprego estrutural são de uma natureza totalmente distinta, envolvendo a formação de desempregados e de trabalhadores com o emprego em risco. Poderão ser também necessários subsídios permanentes para facilitar esta transferência entre sectores. Uma operária poderia ir passar a trabalhar num lar para a terceira idade (onde se espera um grande aumento da procura de funcionários), mas poderá não ter grande incentivo em fazê-lo sem um subsídio que complemente a diferença de salários.

Há alguma similitude entre as mudanças introduzidas pela IA e as trazidas pela globalização. Em geral, a globalização não trouxe aumento sustentado do desemprego, mas produziu grupos de ganhadores e de perdedores. Os ganhos dos primeiros terão sido superiores às perdas dos segundos, mas não houve cuidado em compensar os perdedores, que hoje engrossam a multidão de descontentes que alimentam a expansão crescente de partidos nacionalistas.

Talvez tivesse sido possível ter evitado a globalização no passado (na verdade o erro foi não ter cuidado dos perdedores), mas é evidente que nenhum país pode impedir a IA de ter impacto em si, mesmo que tente impedir a sua entrada. Ou seja, o que será essencial é não repetir os erros do passado, identificar quem é prejudicado por estas alterações tecnológicas e ajudá-los.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.