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Internacionalizar não é só enviar alunos para o estrangeiro

A educação tem de ser vista além do retorno económico e a internacionalização carece de uma estratégia articulada entre os vários agentes do ensino superior. O Educação Internacional esteve na FAUBAI 2019 e verificou que Portugal tem de ser mais competitivo.
12 Maio 2019, 19h00

“A educação é muito mais que o retorno económico que ela dá. Significa uma vida mais longa e a aquisição de competências sociais, fundamentais para promover a compreensão e a tolerância”. As palavras do responsável do Banco Mundial para a Educação Superior na Índia e Sudeste Asiático, Francisco Marmolejo, como que sintetizam o pensamento geral da Conferência Anual FAUBAI 2019, que decorreu na cidade de Belém, capital do estado do Pará, entre 13 e 17 de abril.

Durante estes cinco dias, o Educação Internacional acompanhou a missão “Next Step” da Associação Nacional dos Jovens Empresários – ANJE, liderada pelo vice-presidente, Hugo Serra Lopes, também presidente da FAJE- Federação das Associações de Jovens Empresários da CPLP e integrada por Tiago Cardoso em representação do projeto Nguzu, associado da FAJE, e pela Sharing Foundation, que opera na área da educação.

Em Belém tivemos a oportunidade de ouvir várias vozes em defesa da educação no Brasil e, de um modo geral, no mundo. Logo na sessão de abertura, no simbólico Theatro da Paz, jóia da arquitetura neoclássica da Amazónia, Tabata Amaral, de 25 anos, politóloga e deputada federal do PDT, eleita por São Paulo, explicou à plateia como fintou o destino. O talento para a matemática foi o trampolim para escapar do bairro pobre onde nasceu, na periferia de São Paulo, e ir estudar para um colégio privado com a ajuda de uma bolsa. Mais tarde, rumou a Harvard, onde se formou em Ciência Política, também com uma bolsa de estudos. “Foram as oportunidades iniciais na educação que eu tive e que todo o mundo ao meu redor não teve”, explicou a cofundadora do Mapa Educação, organização social que luta para que a educação seja uma prioridade para a classe política no Brasil.

No encerramento da conferência, Maria Leonor Freire Maia, presidente da FAUBAI, retomou o ideário expresso na sessão de abertura. E reconheceu, perante as cerca de 600 pessoas presentes no Hangar Centro de Convenções da Amazónia, que a “questão é o acesso e a equidade na educação” e que, no “Brasil, grassa a desigualdade”. Para de seguida proclamar: “O que importa não é fazer diferente é fazer a diferença”.

A partilha de experiências

A conferência anual da FAUBAI, este ano na 31. ª edição, é o mais importante encontro sobre internacionalização da educação superior do Brasil e um dos principais da América Latina. Este evento junta representantes de instituições de ensino superior e organizações brasileiras e estrangeiras, bem como membros de agências estrangeiras e de organizações governamentais e empresariais.

Além das sessões plenárias, subordinadas ao tema “Compromisso Social Global”, a FAUBAI 2019 produziu dez workshops e 33 sessões paralelas, num total de 100 apresentações temáticas, trabalhos científicos e experiências de cooperação.Um dos workshops foi ministrado por Carlos Ramos, professor coordenador principal do ISEP, escola de engenharia do Instituto Politécnico do Porto. O docente apresentou o projeto “LAPASSION”, que envolve cinco Institutos Federais do Brasil e visa transmitir boas práticas de inovação pedagógica utilizadas na Europa. Rubipiara Cavalcante Fernandes, da mesma instituição, partilhou com o auditório as experiências de intercâmbio com instituições brasileiras. Falou do double degree entre o português ISEP e o Instituto Federal de Santa Catarina no mestrado de Engenharia Eletrotécnica/Engenharia Power Systems, válido em Portugal e no Brasil. “A proximidade dos conteúdos é fundamental para concretizar um projeto desta natureza”, explicou. Seguindo este bom exemplo, o ISEP está a negociar, segundo revelou, uma parceria com a Escola Superior de Tecnologia de Setúbal.

A Universidade do Porto esteve em peso em Belém. A delegação, liderada pela vice-reitora para as Relações Internacionais e Formação e Organização Académica, Maria de Lurdes Fernandes, incluía a diretora do Serviço de Relações Internacionais Bárbara Costa, e deu a conhecer a iniciativa “The Erasmus+ Rec-Mat Project”, que visa o reconhecimento académico entre a América Latina e a Europa. Magda Ferro, diretora de Relações Internacionais da Universidade Católica Portuguesa – Porto, defendeu que a internacionalização é muito mais do que ter alunos estrangeiros na instituição (ver página 17). Armando Pires, do Instituto Politécnico de Setúbal, em representação do Conselho Coordenador dos Institutos Superiores Politécnicos, traçou o papel do CCISP com vista a uma cooperação sustentável entre os politécnicos portugueses e europeus e instituições congéneres do Brasil. A questão da sustentabilidade leva-nos de novo a Francisco Marmolejo. O responsável do Banco Mundial defendeu a ligação entre internacionalização e prioridades. “Ser estratégico na definição das áreas prioritárias, torna a instituição mais eficiente no estabelecimento de parcerias internacionais”. Além disso, disse, “é crucial estabelecer parcerias baseadas no respeito mútuo e na compreensão dos pontos fortes e fracos dos envolvidos”.

Internacionalizar

Os assuntos internacionais das instituições de ensino superior são o core da FAUBAI. Daí que uma das primeiras sessões do primeiro dia seja dedicada à gestão do departamento de Relações Internacionais. Rita Louback, professora na Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais e secretária-geral da associação, define o perfil para a função, explica como se lida com a questão orçamental e se desenha uma parceria. Diz também que internacionalizar não é apenas mandar alunos para fora, é necessário criar um ambiente propício para crescer com alunos vindos do exterior. Esse duplo movimento não é uma moda: “não vai passar e se não o fizermos não seremos relevantes”, salienta. Outra questão levantada por Rita Louback tem a ver com o papel central que as línguas estrangeiras desempenham no mundo global. Portugal será um destino preferencial devido a diversos fatores, com particular destaque para a língua. “Há muitos alunos que querem ir para Portugal. As vagas são muito disputadas”. E deixa alguns conselhos: “se os vossos alunos aprenderem outro idioma além do inglês, terão mais oportunidades. Incentivem-nos a pensar noutros países que não os óbvios. Diversifiquem a vossa carteira de parcerias”. Louback também defende que a união faz a força. O trabalho em rede é uma tendência. “Quando se participa em bloco dá mais peso, aumenta a visibilidade”.

Visibilidade foi o que não faltou aos principais exportadores de ensino superior do mundo anglo-saxónico. Austrália, EUA, Canadá, Reino Unido e Irlanda estavam em peso e com espaço próprio neste lugar privilegiado para o desenvolvimento de parcerias, promoção de programas, serviços e ‘expertises’ de educação internacional. Portugal não teve espaço próprio na FAUBAI, estando representado individualmente pelas instituições que referimos. Sabe a pouco.

Portugal tem de pensar numa estratégia conjunta para a promoção do ensino superior e avançar para competir de igual para igual com os concorrentes anglo-saxónicos. Não tem apenas a vantagem comparativa da língua, mas também a relação histórica, a qualidade da educação, o custo de vida e a segurança.

*em Belém do Pará, Brasil

Artigo publicado no “Educação Internacional” do Jornal Económico a 10-05-2019

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