As notícias dos últimos dias radicam num conjunto alargado de problemas, cujas soluções estão quase implícitas na formulação daqueles. Em primeiro lugar uma taxa de IRC demasiado elevada, que dificulta a atracção de investimento privado, sobretudo estrangeiro.

Segue-se um intervencionismo, que se revela em múltiplos aspectos. Por um lado, somos o segundo país da OCDE em que a diferença entre a taxa legal máxima e a taxa efectiva é mais elevada, com uma diferença de cerca de 6 pp., o que torna o acesso aos benefícios fiscais anormalmente importante. Como a legislação é pouco transparente e muitos benefícios não são automáticos, os contactos das empresas com a administração pública e/ou com o governo são quase obrigatórios. O próprio executivo faz depender alguns incentivos de decisões suas avulsas, reforçando este aspecto.

A actividade de lobby, quase imprescindível, como vimos, não está legislada, o que só aumenta a nebulosidade.

Para ajudar à festa, a administração pública move-se a um ritmo paquidérmico, não só por tradição e ineficiência, mas também por ter pânico de ser acusada de corrupção, se acelerar a resolução de processos.

Perante a actual crise da habitação, o que mais tem chocado é que praticamente não há nenhuma câmara onde tenha havido uma mudança na costumeira morosidade dos licenciamentos. Uma das respostas que tenho ouvido é que muitos funcionários públicos têm pânico que, se passarem a ser mais expeditos, possam vir a ser acusados de corrupção.

Ou seja, tudo indica que o Ministério Público (MP) faz uma leitura equivocada da lei, não conseguindo fazer uma distinção clara entre pressão para acelerar um processo cujo atraso não tem justificação aceitável e corrupção.

Uma coisa é certa: este equívoco do MP constitui um grave obstáculo ao desenvolvimento do país. Há fortes indícios de que parte da lentidão da administração pública é puramente artificial, para evitar problemas com a justiça e, com isto, há milhares de postos de trabalho que deixam de ser criados, há desenvolvimento que não acontece.

Finalmente, temos todo um clima de impunidade que os poderosos sentem, que os casos de José Sócrates e Ricardo Salgado ilustram como permanecendo quase intacto. Até se pode destapar a ponta do iceberg da corrupção, mas sem consequências práticas, quer em termos de prisão, quer, sobretudo, de obrigação de devolver o dinheiro desviado.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.