A rábula em torno das negociações para a subida do salário mínimo teve o mérito de relançar a discussão pública sobre o Pagamento Especial por Conta (PEC), uma tributação aplicável às empresas em sede de IRC. Criado com o intuito de combater a evasão fiscal, o PEC traduz-se, na prática, num imposto mínimo de 1% sobre o volume de negócios do período de tributação anterior, sendo por isso aplicável também a empresas que não tenham lucros. Ora, cerca de 75% das empresas portuguesas não pagam IRC justamente por não terem lucros. Mas, ainda assim, têm de liquidar um PEC.

Dir-me-ão que a parte do pagamento que não puder ser deduzida por insuficiência de coleta é reembolsável a pedido da empresa. Acontece que tal só é possível após seis períodos de tributação e depois de ultrapassado um intricado processo burocrático, concebido, senão para impedir, pelo menos para dissuadir as empresas de solicitarem o reembolso. Neste sentido, o PEC ilustra em certa medida a relação do fisco com as empresas. Uma relação muitas vezes difícil, injusta e complexa.

O fim do PEC foi prometido por vários governos, mas o pagamento persiste para desespero de muitas micro e pequenas empresas que se debatem com problemas de tesouraria. As associações empresariais, nomeadamente a ANJE, têm lutado para que a extinção do PEC se concretize finalmente e o Executivo de António Costa prometeu fazê-lo, havendo pressões neste sentido dentro da própria “geringonça”. Não deixa, aliás, de ser irónico que o PCP e as associações empresariais estejam juntos pelo fim do PEC…

Se o PEC parece caminhar para o seu estertor, já o mesmo não se pode dizer da excessiva carga fiscal sobre as empresas. O atual Governo, em boa medida pela necessidade de gerir os equilíbrios internos da “geringonça”, continua relutante em baixar o IRC. Isto apesar de, na anterior legislatura, o PS ter acordado com os então partidos do governo, PSD e CDS/PP, uma descida gradual do IRC, entretanto suspensa.

O esforço financeiro que é pedido a muitas empresas com o aumento do salário mínimo merecia, a meu ver, medidas de compensação mais amplas em sede fiscal. Não está em causa a subida do salário mínimo, que considero socialmente justa. Mas sendo o valor do aumento salarial desfasado da evolução da inflação e da produtividade, a competitividade das empresas deveria ser salvaguardada com uma descida do IRC. Tanto mais que, como já percebemos, a redução dos custos do trabalho por via da TSU parece ser uma questão tabu na política portuguesa.

A redução do PEC em 100 euros acordada na Concertação Social é positiva, mas tem um efeito limitado no conjunto das empresas. Desde logo porque o impacto da subida do salário mínimo será sentido sobretudo nas empresas de mão de obra intensiva, em muitos casos dos setores exportadores, para as quais uma descida de 100 euros não tem expressão na tesouraria. Por outro lado, era importante que, neste processo de reposição de rendimentos, fossem premiadas as empresas que são de facto competitivas, dão lucros e criam emprego. Ora isto faz-se, precisamente, desagravando a carga fiscal em sede de IRC.

De resto, uma política de desagravamento fiscal tenderia a promover o investimento privado e a atrair investimento direto estrangeiro. Numa economia com graves problemas de financiamento, os estímulos fiscais são fundamentais para inverter uma conjuntura de baixo investimento, como é a atual. Segundo a OCDE, o investimento em Portugal está mais de 30% abaixo do nível de 2005, pelo que o país deve concentrar muitos dos seus esforços na resolução deste problema. Algo que é incompatível com a persistência de um quadro fiscal altamente penalizador para as empresas.