Como era altamente previsível face ao cuidado com que a Igreja Católica Portuguesa definiu a estratégia, caberá a Portugal a organização das Jornadas Mundiais da Juventude 2022. Aliás, a presença no Panamá dos presidentes da República e da Câmara Municipal de Lisboa não deixava margens para dúvidas sobre o sucesso da candidatura portuguesa. Marcelo e Medina fizeram a viagem perfeitamente convictos de que a vitória nunca estaria em causa.

Agora abre-se uma nova etapa. É preciso saber estar à altura da distinção recebida. Malgrado a condição laica do país, o poder político aprestou-se a manifestar disponibilidade para colocar os seus préstimos ao serviço da organização do evento. Uma forma de dizer que António Costa, a exemplo de Marcelo e de Medina, não perdeu tempo a tentar colher dividendos do regresso do Papa Francisco a Portugal. Até o edil de Loures, Bernardino Soares, esqueceu que para os comunistas a religião é o ópio do povo. Um esquecimento facilitado pela forma como Francisco tem encarado o seu papado.

Como é óbvio, nenhum deles desconhece que Portugal irá receber milhares de jovens de todo o mundo. Um ativo que importa capitalizar. Porém, acontece que, por um desses acasos em que a História é fértil, o anúncio feito por Francisco quase coincidiu com as manifestações relacionadas com a atuação policial no bairro da Jamaica. Um bairro onde não falta juventude. Só que a sua língua de comunicação é o crioulo e não o inglês.

Uma juventude com raízes em África, mas que, por conta do jus solis, tem maioritariamente nacionalidade portuguesa. Uma juventude com problemas frequentes no que concerne à identidade. Jovens frequentemente perdidos entre uma África que desconhecem e o país onde aconteceu terem nascido. Uma instabilidade social e emocional que ajuda a explicar muito do que se passa nas várias Jamaicas que existem à volta da cidade grande.

Jamaicas que não dignificam a imagem do país. Algo que o poder político parece demorar a compreender. A discrepância entre as promessas e as ações como marca da vida habitual. Para piorar a situação, até ao nível da palavra tem vindo a acontecer um descontrolo. Daí que António Costa se tenha considerado no direito de chamar racista a Assunção Cristas. Ou que o Bloco de Esquerda – o tal partido populista que se sente ofendido quando é designado como tal – tenha promovido a desautorização na praça pública de uma das designadas forças de autoridade. Daí o risco de a Polícia passar a ser vista como força ao serviço do poder.

A cereja no topo do bolo populista. A vitimização encontra sempre adeptos e ajuda a agudizar o antagonismo entre o povo e a elite. Portugal é assim. Recusa-se a discutir com realismo pragmático os seus problemas sociais na tentativa de encontrar uma estratégia coletiva para a sua resolução. Enquanto isso, exporta cérebros para resolver os problemas da Humanidade. Veja-se António Guterres. Atente-se em António Vitorino.

Face ao exposto, talvez seja tempo de aceitar que o sucesso externo só é autêntico se envolver a componente interna. Vender a imagem de um país multirracial, multicultural e de brandos costumes soa a Estado Novo. Porque, agora como então, não é essa a realidade.