A multiplicação de aplicações e redes sociais permite-nos conhecer em pormenor uma amplitude de sentimentos e informações sobre os mais variados assuntos, propagados por amigos, conhecidos, desconhecidos e… inexistentes. Desde as receitas da avó ao mais recente furacão passando pelas últimas inovações numa profusão de gadgets desnecessários, tudo é partilhado e partilhável, transformando a informação num trilho de dados confuso, impossível de filtrar na veracidade e na utilidade.

É uma significativa e interessante evolução na transmissão do conhecimento, caracterizado pela incerteza, pela falta de seriedade e de rigor científico. Não estamos perante factos, estamos perante atos de curiosidade. Nas redes sociais, à medida que se diversifica o uso e se intensifica a sua proliferação, cresce a deriva do disparate e da arbitrariedade no caminho da cenarização do absurdo pela forma como alguns acreditam: se é publicado, é verdade.

Este absurdo tem assumido uma dimensão assustadora porque se vertem para o espaço do domínio público as frustrações, mediocridades, menoridades e atitudes ridículas que nos assolam e incomodam, embora não nos deixem indiferentes. O ser humano é curioso por definição. E, no éter, estes comportamentos têm sido sublimados.

As reações públicas nestes espaços a anúncios, fotografias ou vídeos reforçam a insensatez de quem usa as redes sociais. A discussão sobre a ideologia do género teve recentemente contornos quase grotescos, desde a reação a uma campanha publicitária para lançamento de uma coleção infantil que não distinguia sexos às acusações de racismo numa campanha de chocolates pela cor mais ou menos escura dos bonecos que ilustram a quantidade de cacau.

Estamos no limiar do ridículo, pois não se trata de nonsense, mas sim de reações de quem é negativo. Não podemos ficar indiferentes a estes comportamentos, na medida em que deixam marcas nos destinatários. Nem podemos considerar que estes comportamentos, por mais replicados que sejam, constituem a criação de uma opinião pública que nos permita caracterizar assim a sociedade em que vivemos. Onde alguns veem os extremos de uma sociedade em decadência, outros encontram uma opinião pública ativa e participante, mas se tal não for referenciado serão os valores e os princípios pelos quais aprendemos a viver em conjunto que ficarão em causa.

Na maior parte dos casos, o recurso ao disparate não é inocente. Na sua génese está o propósito de desacreditar instituições, pessoas e práticas.

Em tempo de denúncia sucessiva de notícias falsas com o objetivo de distorcer a realidade – política, comercial, desportiva – o acesso indiscriminado à informação merece um acrescido escrutínio da comunicação social, que tem a responsabilidade de verificar a veracidade do que se publica. E deve ainda exigir às autoridades uma redobrada atenção a quem a desencadeia.

É pois oportuno que nos indignemos perante atitudes levianas e sem sentido. A liberdade de expressão é um desígnio constitucional. É um direito que assiste a todos. Contudo, o direito ao disparate e à indignidade não têm respaldo no texto fundamental.

No passado, o direito à indignação mereceu um apelo público como forma de manifestação de protesto político. Também aqui deve potenciar os sentimentos daqueles que não se reveem nas atitudes que infetam o quotidiano e contagiam as redes sociais. Estas não deixam de fazer parte do nosso quotidiano. Mas o direito à indignação faz parte das nossas vidas.