As comissões não vão contar para o cálculo da remuneração mensal ilíquida dos trabalhadores que se encontram em regime de lay-off simplificado, regulado pelo decreto-lei 10-G/2020.
Segundo as instruções da Segurança Social sobre o preenchimento do formulário que as empresas têm de submeter para aceder ao regime de lay-off, não estão incluídas as comissões para o cálculo da remuneração mensal ilíquida dos trabalhadores, porque esta remuneração assume natureza incerta e variável.
As instruções da Segurança Social determinam expressamente que, quanto à remuneração ilíquida base dos trabalhadores que estarão em lay-off simplificado, as entidades empregadoras “devem registar a soma das naturezas de “Remuneração ‘P’ – remuneração base, ‘B’ – prémios mensais, e ‘M’, – subsídios regulares mensais, habitualmente recebidas pelo trabalhador, não figurando as comissões, que segundo o despacho nº2-I/SESS/2011, que aprovou a tabela dos códigos de remuneração necessários ao preenchimento da declaração de remuneração, têm o código ‘C’.
Contactado pelo Jornal Económico (JE), o gabinete do Secretário de Estado da Segurança Social, Miguel Cabrita, referiu que “nem do DL 10-G/2020, nem das FAQ se pode retirar que as comissões – por natureza incertas e variáveis – integram a remuneração normal ilíquida”.
As instruções da Segurança Social causaram preocupação no setor automóvel, onde muitos funcionários comerciais recebem, por conta do seu trabalho, o salário base e comissões todos os meses. Contactado pelo JE, Helder Pedro, secretário-geral da Associação Automóvel de Portugal (ACAP), disse que a exclusão da comissões do lay-off simplificado irá afetar “vários milhares” de vendedores de automóveis.
Helder Pedro revelou ainda que “as associadas já contactaram a ACAP” e que a associação “já contactou esta terça-feira o gabinete do Ministério do Trabalho” sobre esta matéria.
Juristas apontam para o Código do Trabalho
Apesar do entendimento do gabinete do Secretário de Estado da Segurança Social, a advogada Rita Correia Afonso, especialista em Direito do Trabalho, referiu que há comissões que são pagas todos os meses, juntamente com a remuneração base dos trabalhadores, tal como constam da folha de vencimento, havendo “tribunais a confirmar que estas comissões têm natureza regular e periódica”.
Depois da publicação do decreto-lei 10-G/2020, o Ministério do Trabalho, Solidariedade Segurança Social (MTSS) remeteu o conceito de retribuição normal ilíquida, para efeitos do lay-off simplificado, para o Código do Trabalho, quando publicou o documento intitulado “FAQ Medidas Excecionais e Temporárias de Resposta à Epidemia Covid-19 Apoio Extraordinário à Manutenção do Contrato de Trabalho”, no dia 27 de março de 2020.
O MTSS explicou que “a lei usa o conceito de ‘retribuição normal ilíquida’. O conceito é mais abrangente do que o de retribuição base, e mais abrangente do que se retira” do artigo do Código do Trabalho que prevê a retribuição base e diuturnidades. Além disso, “o conceito de ‘retribuição normal’ envolve a retribuição base, as diuturnidades e todas as demais prestações regulares e periódicas inerentes à prestação de trabalho, que constem da folha de vencimento”.
A jurista explicou que o lay-off simplificado agilizou o lay-off tradicional previsto pelo Código do Trabalho e que, tanto um como o outro, incluem, dentro do conceito de remuneração ilíquida mensal, “todas as prestações que o trabalhador recebe com regularidade e periodicidade, como as comissões”.
“A segurança Social, através das instruções, está a alterar a lei e o decreto-lei do Governo”, frisou Rita Correia Afonso. “A Segurança Social não tem competências para alterar o significado do conceito de retribuição ilíquida mensal”.
Na mesma linha se pronunciou Rita Garcia Pereira, advogada e mestrada em direito do trabalho, na página do JE dedicada às dúvidas sobre o regime do lay-off simplificado e que pode ler aqui.
Questionada por um vendedor sobre quais os valores que estão incluídos na remuneração normal ilíquida para efeitos de layoff simplificado, a advogada respondeu que “os serviços da Segurança Social têm prestado a informação de que os empregadores deverão considerar excluídas as comissões, mesmo quando constantes dos respectivos recibos de vencimento e sujeitas aos descontos legais”.
“Esta orientação contraria o disposto no [Código do Trabalho] mas uma eventual reacção só poderá ser desencadeada através da ACT ou, após o termo da declaração do estado de emergência, pela via judicial”, concluiu Rita Garcia Pereira.
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