Um tapete não é uma carpete não é um capacho. A espessa Europa dos velhos dias estava a habituada a luxo (hoje dito “prosperidade”) e a ocupar um lugar central na casa económica mundial. Só passado algum tempo é que se apercebeu que era uma carpete, essa espécie de cobertura fofa, mas mais fina, pregada ao chão e usada para a passagem das verdadeiras potências. Parece que agora a União Europeia (UE) se apercebeu que pode ser despromovida a capacho, aquele artigo mais barato onde outros limpam os pés.

Apesar de muitas confusões sobre o seu propósito, de tantas auto-ilusões sobre as capacidades técnicas e produtivas do continente, das pomposas pronúncias sobre o “efeito Bruxelas” que os seus regulamentos/directivas/actos induzem no exterior… apesar disto tudo, eis que já se ouvem (encore une fois) os alarmes.

Em 2023, trinta anos após o estabelecimento do “Mercado Único”, o Conselho Europeu pediu a Enrico Letta que desenvolvesse um relatório “independente” e de “alto nível” sobre o futuro dessa “fonte de riqueza comum”.

Atenção, não confundir com o relatório encomendado a Mario Draghi, esse já não sobre o espaço doméstico da UE, mas sim sobre a competitividade externa. De reter ainda o precedente do Relatório de 2010, coordenado por Mario Monti, durante uma crise na altura só comparada à Grande Depressão. Já terei adivinhado a estupefacção do distinto leitor: de onde virá a preferência das instituições europeias por ex-primeiros-ministros italianos tecnocratas não-eleitos?

Letta intitulou este trabalho de 146 páginas de “Muito Mais que um Mercado – Agilidade, Segurança, Solidariedade” (tradução minha). E é daqueles produtos que foram pedidos e produzidos para influenciar a política europeia para uma década, por isso, devem ser discutidos por cá.

A mensagem principal de Letta é que a UE deve tirar máximo partido do seu tamanho. Para isso é preciso harmonizar e levantar impedimentos, sobretudo, em áreas como a energia, telecoms e mercados financeiros. Descodifiquemos: não quer ele dizer economias de escala à custa de diversidade, não está ele a alimentar a agenda neo-centralizadora desta Comissão?

Diz que a integração europeia surgiu numa era pacífica, mas que hoje os tempos são geopolíticos, hmm, mas como afirmar isso quando a construção europeia decorreu em plena Guerra Fria? No interesse português (e europeu) tais objectivos e premissas podem, devem, têm de ser questionados.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.