O agosto está a chegar ao fim, as férias estão a acabar e aproxima-se o tempo de regresso ao trabalho e à escola. Por esta altura atravessamos esta espécie de ritualidade dos tempos modernos que se repete de ano para ano. Regressamos com a sensação de que nos soube a pouco e que merecíamos descansar um pouco mais, de ter desfrutado mais tempo com os amigos e com a família.
Muitos de nós regressamos também de um outro país que passa esquecido a maior parte do ano, mas que, por estes dias, se enche de pessoas e de visitantes. O país periférico, das aldeias e das vilas, que vive entre o rural e o urbano, situado no interior ou na faixa litoral. São territórios muito diversos mas que comungam também de um ciclo próprio, que, de certa forma, é o reverso do anterior: ganham vida e enchem-se nestes dois meses para a seguir, no resto do ano, voltarem a adormecer e a esvaziar-se.
Neste ano particular, o regresso das férias é marcado por dois sentimentos quase opostos. Por um lado, depois de consecutivos anos de profunda crise, foi percetível uma alegria generalizada nas pessoas, que em parte resulta de um maior desafogo e de uma perceção mais consolidada de que o pior já passou. Talvez pela primeira vez desde o início da presente década o assunto “crise” deixou de dominar muitas das conversas. A crise vai-se esvanecendo do horizonte de muitos portugueses e isso é um dado positivo, revelador de que voltámos a acreditar um pouco mais no nosso país e na sustentabilidade do seu futuro.
Por outro lado, o regresso é simultaneamente marcado por uma certa angústia sobre os territórios que deixamos. É notório que estes se tornaram ainda mais vulneráveis e frágeis. Isso é particularmente visível no caso dos fogos e incêndios florestais que se transformaram na tragédia humanitária do Portugal contemporâneo. Mas também é percetível na debilidade e saturação dos serviços, no abandono das terras, no envelhecimento… Na verdade, é um país que vai resistindo, apesar de já ter ultrapassado o seu limite. E não será esta nova onda de turismo que retirará muitas destas zonas do seu rumo de depressão e de erosão crescente.
Este Portugal periférico, que é cada vez mais periférico, necessita, como tem sido discutido e debatido, de uma resposta política estrutural por parte do governo, dos partidos, das instituições públicas e de outras entidades competentes. Mas necessita também de uma responsabilidade coletiva de todos nós. Este “todos”, que invadiu os múltiplos cartazes e outdoors da campanha eleitoral para as próximas autárquicas, não pode ser apenas um slogan ou uma mera expressão de retórica. Este “todos” implica-nos nas decisões do nosso futuro imediato e, sobretudo, responsabiliza-nos em não fazer esquecer, durante os próximos dez meses, que estes territórios existem e continuam bem visíveis.
Vai ser preciso insistir e romper com a ritualidade confortável do regresso. Este ano é importante não regressar completamente e tentar levar o verão até ao inverno. Ganharíamos todos com isso.