A primeira vez que li a palavra “restruturação” foi num documento de há três décadas, de uma consultora de gestão estratégica, que escrevia sobre a muito necessária restruturação da banca portuguesa. E julgo que compreendi o sentido, então. Segmentar, reforçar competências tecnológicas e marketing, cultura de serviço ao cliente, redesenho dos espaços dos balcões. Recomendava, a consultora, o envolvimento dos trabalhadores, através de seus representantes sindicais em processos que envolviam muito esforço de adaptação e requalificação profissional. Então, como agora, uma busca de mais e melhor. Ênfase na eficácia, e muito menos na eficiência.

Os bancos a actuar em Portugal fizeram tudo isso, conseguiram níveis de rendibilidade interessantes no contexto europeu, atraíram capitais e remuneraram condignamente os trabalhadores. Mérito a estes e às equipas de gestão. E à forma como foram envolvendo os diversos interessados e parceiros das empresas bancárias.

Ultimamente começaram-se a ouvir os novos arautos, vindos da mesma consultora, da “restruturação imperiosa”. Continuando a usar um anglicismo, veio o ponta-de-lança oficioso avisar que os bancos teriam que fazer uma nova restruturação. Além de ter de ocorrer num curto espaço de tempo, a dita restruturação seria sinónimo apenas de encerramento de balcões e redução de quadros de pessoal.

Infelizmente nada se diz sobre renovados modelos de negócio, ou sobre maneiras de combater a desintermediação financeira, o excesso de regulação e os absurdos requisitos de capitais próprios. Nem uma palavra sobre os concorrentes que não empregam, não pagam impostos e operam a partir de praças pouco reguladas. Nada, de nada, sobre a política de taxas de juros nulas do BCE.

E, espantosamente, nada diz sobre o papel dos parceiros sindicais nessa restruturação. Nem uma palavra sobre a necessidade de envolver os representantes dos trabalhadores no desenho da banca do futuro. Ignorando como os alemães e nórdicos usam os abundantes recursos da co-gestão para assegurar empresas mais resilientes, com melhores empregos e melhores remunerações accionistas.

Claro que alguns bancos pretendem usar por cá a receita míope desta consultora: encerrar balcões e desvincular trabalhadores. Tudo à bruta, ao arrepio da lealdade dos clientes e do esforço e dedicação de décadas dos trabalhadores.

Bastava que olhassem para o transporte aéreo, fortemente condicionado em toda a Europa (ao contrário dos bancos não tiveram lucros para apresentar em 2020) e onde em todos os processos de restruturação são envolvidos os sindicatos e as comissões de trabalhadores. Mesmo na TAP se recorreu à concertação de todos para produzir menor dor e acelerar a recuperação da companhia.

Não envolver os representantes laborais é sinal de pouca inteligência, falta de visão estratégica ou, porventura, de má-fé. Por isso é importante relembrar aos accionistas o sentimento dos soldados britânicos na Primeira Guerra Mundial, quando sentiam, amargamente, como líderes burros e incompetentes os levavam a uma morte certa. Alguns trabalhadores bancários sentem-se, tal como os soldados de há um século, “lions led by donkeys”.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.