… O triste fado dos advogados

Os momentos actuais estão para além do que um dia poderíamos imaginar ser possível. Coisas que sempre demos por garantidas, como a frequência de um ginásio ou uma ida a um concerto, deixaram de ser possíveis. Passei a ter no telemóvel e computador imensas aplicações que me permitem manter a ilusão de alguma normalidade, enquanto o mundo real parece estar todo em suspenso, à espera de ganhar uma guerra a um inimigo invisível.

Confrontados com uma ordem de confinamento sem um prazo à vista, a maior parte de nós tem os olhos postos na inevitável crise económica e nas suas consequências para o respectivo agregado familiar. Palavras que raramente eram usadas, como lay-off, teletrabalho ou compensação retributiva entraram para o léxico dos portugueses, sendo correctamente apresentados como paliativos para uma situação que não esperávamos voltar a sentir tão cedo.

Entretanto, no que aos advogados se reporta, a situação parece ser ainda pior. Não apenas somos confrontados com a paralisação genérica da nossa actividade, operada de forma abrupta e, refira-se, atabalhoada, como não temos qualquer, (leram bem, qualquer) protecção da Segurança Social, no mesmo passo que as contas no final do mês se mantêm todas.

Ao invés do que sucede na dita Segurança Social, a “nossa” Caixa de Previdência dos Advogados e Solicitadores a única coisa que parece disponibilizar neste momento de emergência, que se está  a tornar também de emergência social, são referências para pagamento das respectivas contribuições.

Pelo meio, atendendo a que a prestação que compete a cada um pagar, sob pena de juros completamente usurários, não está indexada a qualquer rendimento real, a CPAS continua a fazer o percurso de exigir dinheiro, mesmo daqueles que estão sem receber seja o que for.

Confrontada a sua direcção esta semana, a única resposta que conseguiu fornecer foi a de que, com vista a fazer face às dificuldades financeiras com que se debatem, os advogados podem sempre suspender a actividade, caso em que, de facto, não têm que pagar mas, pasme-se!, também nada podem ganhar.

Quem se deu ao trabalho de ouvir a assembleia geral ocorrida esta semana não pode deixar de julgar que, seguramente, algo se perdeu entre o que era dito pelos advogados e solicitadores e as respostas do Senhor Presidente da Direcção. E, refiro eu, perdeu-se o essencial.

Uma Caixa que se diz de Previdência não suga os seus membros até à morte, sob pena de se transformar num mero buraco sem fundo. E uma Direcção que seja verdadeira não se limita a deixar a música a tocar enquanto o barco afunda. Ainda que seja um fado: o triste fado dos Advogados.

A autora escreve de acordo com a antiga ortografia.