Anteontem, no início da greve dos motoristas, as televisões mostraram um dos sindicalistas ostentando um curioso cartaz. Nele se via o primeiro-ministro tendo por companhia a imagem de uma maçã podre. A inspiração é evidente: a conhecida capa da revista “Time”, de 1946, onde Salazar se mostrava igualmente acompanhado do mesmo fruto estragado e onde a propósito do mais “antigo Ditador da Europa “se perguntava: “Portugal: how bad is the best?”.
Que a comparação possa parecer absurda – e é se tomarmos por referência ambos os políticos que nada têm que ver um com o outro – a mensagem que pretende passar não é disparatada. E ela diz -nos que o Governo socialista, apoiado por comunistas (seguramente o mais esquerdista de todos os governos europeus) é visto pelos motoristas como o amparo dos patrões e o adversário dos trabalhadores, ao criminalizar, na prática, o direito à greve.
Bem pode o Governo invocar à boca cheia a defesa do interesse público e arregimentar toda a parafernália estatal (tribunais, emergência energética, governo de crise, requisição civil, forças armadas) no que certamente merecerá, como todos os comentadores o dizem (e quem sou eu para o contestar) o apoio da esmagadora maioria dos portugueses, que não se livra da acusação: ser uma aparência (maçã saudável) que esconde a realidade (maçã estragada).
Pelo menos é isso que pensa a classe profissional que nos últimos tempos mais desconsiderada e vilipendiada tem sido. E é bem capaz de não pensar mal. Porque, verdadeiramente, por diferentes que sejam os tempos e os regimes políticos, a pergunta, quando se discute a forma como o Estado exerce o poder político, nunca deixou de colocar- se: how bad is the best?
O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.