Assinalam-se este ano os 25 anos da retrocessão de Macau. Depois de longas negociações, no dia 20 de Dezembro de 1999, findava a administração portuguesa e iniciava-se um novo ciclo governativo que mantinha Macau como Região Administrativa Especial por um período de 50 anos, sob soberania chinesa. Nesse período transitório para a incorporação nas dinâmicas políticas, sociais e económicas da China, o português permaneceu como língua oficial e os portugueses continuam a beneficiar de prerrogativas específicas, como a isenção de visto por três meses.

A economia de Macau, embora se mantivesse dependente das indústrias do entretinimento e lazer, sobretudo, o jogo, cresceu dramaticamente, para o qual contribuiu o cada vez maior número de visitantes chineses. Entretanto, outros setores beneficiaram dessa aproximação à China, entre estes o setor do ensino superior que é também um enorme exportador de serviços, sobretudo, para a China continental.

Nesse sentido, Macau continua a ser um território atrativo, oferecendo uma ideia de cosmopolitismo ao visitante chinês. Ultrapassadas as dificuldades da pandemia que revelaram as fragilidades de um território tão dependente da procura externa, regressou-se às bases económicas tradicionais da região, mas com um reforço da vontade de diversificação dos setores económicos em atividade.

25 anos depois, Macau enfrenta problemas tradicionais e novos. Se a questão da diversificação da economia tem sido uma promessa adiada, surgem novos desafios como a integração económica, social e política no gigantesco território chinês, articulando especificidades diferenciadoras que tornam Macau atrativo com a necessidade de convergência com o espaço chinês. Uma das marcas características únicas da região é a sua ligação a Portugal e aos Países de Língua Portuguesa que agora precisarão de ganhar outro fôlego. A par desta marca identitária do território, o projeto económico e político de integração na Grande Baía.

Macau, Portugal e os Países de Língua Portuguesa

Por iniciativa da China, funda-se, em 2003, o Fórum de Macau. Esta organização internacional de iniciativa chinesa reúne todos os países de língua portuguesa, tendo por base fundadora as relações comerciais. Mais tarde e depois da Guiné Equatorial ter sido aceite entre os países da Comunidade de Países de Língua Portuguesa – CPLP, este país acabou por se juntar ao grupo de países representados em Macau neste fórum.

O Fórum de Macau instalou-se num novo edifício, construído para o efeito, perto da Assembleia Legislativa da Região Especial Administrativa de Macau. O edifício alberga os representantes dos vários países, bem como, toda a estrutura funcional do fórum e também uma sala de exposição permanente com produtos dos países de língua portuguesa (com o contacto da empresa fornecedora de cada produto) e salas para conferências.

A ideia de promover o comércio entre a China e os Países de Língua Portuguesa ainda aparece como uma âncora importante do fórum, apesar de a instituição ter agora uma maior variedade de áreas de cooperação. Para além da cooperação intergovernamental e intercâmbio com organizações internacionais, visa-se estabelecer um relacionamento permanente em áreas como o comércio e investimento, a economia digital, a cooperação setorial (agricultura, pecuária e pescas; transportes; economia azul; infraestruturas; finanças), a cooperação em novas áreas que contribuem para o desenvolvimento (médico-sanitária; conservação ambiental; tecnológica; pequenas e médias empresas) e, finalmente, a cooperação cultural (educação e recursos humanos; cultura e turismo; meios de comunicação social; desporto). Macau aparece, assim, como uma plataforma de ligação da China a estes países, mas também em sentido inverso, conectando os Países de Língua Portuguesa aos grandes projetos chineses como a Nova Rota da Seda ou a Grande Baía.

A integração na Grande Baía

Macau está integrado no projeto Grande Baía Cantão – Macau – Hong Kong, usufruindo neste momento da possibilidade de integração na região com maior rendimento e mais tecnológica da China. A cedência de terreno na zona fronteira da ilha de Hengqin, com soberania partilhada entre o governo central chinês e o governo de Macau, oferece a possibilidade de desenvolvimento de novas atividades económicas, promovendo, também uma fusão progressiva entre Macau e a China continental.

Espera-se que esta integração no espaço económico da Grande Baía permita a Macau a diversificação da sua economia, mas também que seja uma oportunidade para o território se afirmar como plataforma atrativa para todos os países de língua portuguesa, incluindo aqueles que durante este período de funcionamento do Fórum continuaram a apostar nas relações bilaterais através de Pequim, deixando relegado para segundo plano esta instituição. Desta forma, este novo projeto económico poderá tornar-se num fator decisivo não só para a progressiva integração de Macau na China continental (por via económica) como finalmente impulsionar o papel de plataforma que a China sempre previu para Macau. Como todos os outros estados de língua portuguesa, Portugal poderá beneficiar deste novo contexto do ponto de vista económico e reforçar a sua presença em Macau que conheceu um decréscimo acentuado nos últimos anos.

Macau, o exemplo

Findo um primeiro ciclo de 25 anos e encontrado pela China o modelo de incorporação progressiva na parte continental do país, parece óbvio que a China teve a perceção de que Macau teria de tornar-se no exemplo de uma integração pacífica e frutífera, prova última do sucesso da fórmula um país, dois sistemas.

A preferência com que hoje os chineses olham para Macau, em detrimento de Hong Kong, prova que os olhos estarão postos em Macau. Território pequeno, mas diverso, cosmopolita desde o século XVI e construído em torno de consensos que permitiram uma convivência duradoura dos portugueses na China, Macau mantém-se como o ponto de contacto com o mundo lusófono e como região pacífica.

A tomada de posse do novo governo, em que, pela primeira vez, estarão cinco falantes de português e conhecedores da cultura portuguesa, entre estes o Chefe do Executivo pode ser um momento de viragem. O novo governo traz grande esperança numa época de desafios iminentes, pelo processo de integração em si e pelo ambiente internacional que o envolve. O executivo será constituído por onze elementos, cinco dos quais nascidos em Macau, um nascido em Hong Kong e quatro nascidos em Cantão, representando amplamente a região da Grande Baía.

A fluência da língua portuguesa e a experiência de Portugal poderá contribuir para um diálogo frutífero entre a China e os Países de Língua Portuguesa, com especial relevo para Portugal. Espera-se por essa razão que os tempos de diplomacia voltem e que Macau possa usar o seu papel de plataforma para manter a sua especificidade enquanto território que não teme a sua progressiva integração na China.

O que seria uma integração exemplar de Macau na China? Seria aquela que observa as características do lugar e que não terá a necessidade de retirar os nomes em português das ruas, porque estes ali estarão como um tempo e um espaço de memória construtiva e não conflituante com o facto de Macau ser parte da China.