Enquanto todas as atenções têm estado focadas na comissão parlamentar de inquérito à gestão da TAP (apesar das intermináveis sessões ainda não percebi quais os stakeholders da empresa que mais beneficiaram da ajuda pública de 3.200 milhões de euros), e as viagens de avião do primeiro-ministro e presidente da república para assistir a jogos de futebol, foi publicado um importante relatório com dados sobre a eficiência, qualidade e independência dos tribunais na União Europeia (UE).

O Painel de Avaliação da Justiça na UE, divulgado em Junho pela Comissão Europeia, tem por propósito monitorizar as reformas judiciais nos Estados-Membros em questões como a eficiência, a qualidade e a independência dos tribunais. Os dados mostram que Portugal é o quinto país da UE com os processos judiciais mais longos, tanto em tribunais de primeira instância quanto superiores.

Com base nos dados de 2021, o país levou 792 dias para primeira instância, 836 para a segunda e 261 para a terceira! Portugal também é o pior em termos de tempo para decisões administrativas de proteção ao consumidor, com uma média de 837 dias! Neste top 5 da (in)eficiência judicial temos a companhia de Chipre, Chéquia, Malta e Grécia, países que também tem nível de desenvolvimento económico e social abaixo da média da UE.

Este importante relatório teve pouco destaque nos media. A reduzida cobertura talvez se deva ao facto de já não ser novidade a falta de eficiência e qualidade dos nossos tribunais e estarmos resignados com a situação. Eu ainda não estou preparado para desistir do nosso país pois este tema é crítico para o desenvolvimento económico e social.

A falta de eficiência, qualidade e independência dos tribunais é uma barreira fundamental ao desenvolvimento como é demonstrado em inúmeros artigos científicos sendo os mais famosos: “Law and Finance” (1998) de Rafael La Porta, Florencio Lopez-de-Silanes, Andrei Shleifer, and Robert Vishny que mostra que os países com melhores sistemas judiciais têm maiores níveis de desenvolvimento financeiro e “The Quality of Government” (1999), dos mesmos autores, que mostra que países com sistemas judiciais mais eficientes têm um PIB per capita mais elevado e maior crescimento económico.

Um bom sistema judicial é indispensável pois garante o Estado de Direito, protege os direitos das pessoas e faz cumprir as relações e os contratos entre o estado, empresas e cidadãos. Este sistema tem um papel crucial na formação de um bom ambiente de negócios, atraindo investimentos e apoiando o crescimento das empresas. É também fundamental para proteger os direitos dos consumidores e trabalhadores. Um sistema ineficiente tem custos enormes de tempo e dinheiro para todos, tais como, horas de trabalho, custos judiciais e litigação, etc. E poderia continuar com inúmeros exemplos da importância de melhorar a eficiência e a qualidade dos tribunais.

Portanto é fácil! Melhoramos a eficiência e qualidade das nossas instituições legais e o PIB per capita aumenta, a produtividade e os salários aumentam, e talvez consigamos ultrapassar a Roménia! Porque é que não acontece? Podemos dizer que a culpa é de Napoleão a quem devemos a origem do nosso sistema legal. Mas já passaram alguns séculos para atirar as culpas exclusivamente para o ex-presidente francês.

A responsabilidade deve ser partilhada pelos políticos e vários atores do sistema judicial. Temos um legado pesado e muitos interesses instalados que beneficiam do atual sistema ineficiente e políticos sem a coragem suficiente para promover uma reforma estrutural.

Sugiro pedirmos ajuda externa a uma organização internacional para fazer esta importante reforma a curto prazo. Sugiro também envolver economistas, empresários, e organizações sociais (entre outros) na reforma do sistema. Não devemos deixar essa reforma apenas nas mãos dos juristas porque uma visão independente e “fora da caixa” é fundamental para a reforma ser bem-sucedida. Esta reforma é crítica (juntamente com a melhoria do sistema educativo e das qualificações da população) para Portugal poder dar um salto em termos de crescimento económico.

Já agora o que é que tema tem a ver com sustentabilidade e os ESG? O Objetivo de Desenvolvimento Sustentável nº 16 é sobre “paz, justiça e instituições eficazes”. O sistema judicial desempenha um papel central na implementação dos objetivos de desenvolvimento sustentável, ao promover a responsabilidade ambiental, proteger os direitos humanos, garantir a transparência e a prestação de contas, e fornecer segurança jurídica e estabilidade.

Um sistema judicial forte e eficaz é essencial para criar um ambiente propício para as empresas adotarem práticas sustentáveis e contribuírem para um desenvolvimento económico e social mais equilibrado e sustentável.