A estratégia de comunicação implementada em Portugal para lidar com a pandemia da Covid-19 é igual a todas as estratégias implementadas em todas as crises que o poder político enfrentou até 2011. O que nos deve deixar desde já sob alerta. Valoriza-se a forma e foge-se o mais possível da transmissão de um conteúdo que tenha verdadeiro conteúdo.

Expressões como “daqui a 3 meses poderemos voltar à normalidade” ou “até agora não faltou nada e não faltará” demonstram a falta de conteúdo sério que tem prevalecido nas mensagens transmitidas pelos mais altos representantes políticos. E, acima de tudo, tratam os portugueses como destituídos.

Liderar não é apenas estar presente no espaço mediático, liderar é antecipar, não ter medo dos números, assumir riscos e transmitir todos os dados, por mais “cruéis” que sejam. Mesmo que se coloque em causa a esperança de vida da liderança. Pois o que deve prevalecer é a esperança de vida dos indivíduos.

Pelo contrário, aquilo a que assistimos é a uma atuação arcaica dos nossos políticos demonstrando que, mesmo em situações totalmente excecionais, não estão disponíveis para sacrificar a sua popularidade. Reagem e agem em função das pequenas vitórias pessoais ou partidárias.

Esta é uma crise com um impacto sem precedentes, o que exigiria desde logo uma estratégia de comunicação mais focada na mobilização social. Isso deveria ser feito com coragem para afirmar a dureza do que viveremos enquanto sociedade nos próximos anos. Não é nos próximos três meses.

O facilitismo não foi bom conselheiro até aqui (como demonstra o falhanço na capacidade de antecipação, assim como a forma híbrida como foi implementado o estado de emergência) e a gestão de expetativas está a ser feita de forma leviana.

No contexto atual exige-se não só verdade mas também seriedade na comunicação. O que os responsáveis políticos deveriam estar a assumir é o que está a faltar e o que pode vir a faltar, em vez de dizerem que “não falta nada e que dificilmente faltará”. Reconhecer que necessitamos de ajuda é uma força, não uma fraqueza.

O primeiro passo para ultrapassar uma crise, profunda como esta, é a necessidade de um diagnóstico e de uma auto-avaliação honesta. Assim como recolher e aprender com a experiência de crises anteriores. Só assim poderemos implementar uma estratégia de comunicação que enfrente a realidade, reconheça os erros, as fragilidades e as incertezas e assuma, sem paliativos, os grandes encargos e o tempo que levará a superar essa crise. Assumir uma estratégia de comunicação que valorize o conteúdo aceitando a responsabilidade e evitando a vitimização.

Uma comunicação que assuma uma informação seletiva e rigorosa, sem esconder ou ter medo dos números. Uma comunicação que use os melhores exemplos dos países que melhor estão a lidar com a Covid-19 e não que se compare com os piores. Valorizar a nossa cultura enquanto sociedade e o que nos valoriza na integração e no multilateralismo necessário para vencermos este desafio. E proximidade.

Apesar da necessidade de afastamento social, a comunicação institucional deve ser o mais próxima possível. Isso parece também não estar a acontecer quando a presença em redes sociais de forma proativa é diminuta, deixando espaço a que outra informação menos correta domine. E valorizar o timing. O tempo em política e numa gestão de crise é fundamental. Ora, a estratégia de comunicação implementada para a Covid-19 desvalorizou totalmente esta variável, incutindo assim facilitismo e desvalorização no espaço público.

Agora corremos atrás do prejuízo. E ouvir que daqui a três meses voltaremos à normalidade revela irresponsabilidade.

Não se mobiliza a sociedade civil para o que poderá ser o maior desafio das nossas vidas ao afirmar que em três meses tudo voltará à normalidade. Assim como também não se mobiliza ninguém com encenações demagógicas de saídas do plenário da Assembleia da República, como o fez o presidente do PSD. A gestão de expectativas está a ser feita de forma leviana e focada apenas no dia a dia. E todos são responsáveis.

A última sondagem do ICS/ISCTE revela que 44% dos portugueses considera que o facilitismo tem imperado quando afirmam que “são necessárias mais restrições”. Não é uma novidade, pois no que toca à saúde as pessoas estão maioritariamente disponíveis para qualquer sacrifício que seja necessário para salvar a vida. O que espanta é que mesmo numa situação como esta os mais altos responsáveis políticos não estejam dispostos a sacrificar a sua popularidade.

Talvez a oportunidade que esta crise traz aos políticos seja a possibilidade de se comportarem com maturidade e assumirem a política com transparência, frontalidade e seriedade. Não é só uma questão de falar verdade, é o que os políticos fazem com a verdade. Se têm ou não a coragem de afirmá-la sem subterfúgios.

É em momentos excecionais que os líderes se revelam. Infelizmente, em Portugal, ainda nenhum se revelou durante esta crise.