No rescaldo da crise de 2008 e perante o aumento do desemprego e a degradação das condições de vida, as ruas encheram-se para exigir uma sociedade mais justa, menos desigual e com mais proteção social. Hoje, a crise da Covid-19 agrava ainda mais o fosso das desigualdades, como revela o Barómetro Covid-19 da Escola Nacional de Saúde Pública (ENSP).

A crescente concentração de rendimento nos mais ricos permanece uma das principais questões sociais do nosso tempo e um reflexo da incapacidade das políticas públicas proporcionarem igualdade de oportunidades e justiça na distribuição do rendimento. Também aqui Portugal não é exceção. De acordo com dados do Eurostat, em 2018, os 20% portugueses mais pobres detêm apenas 8% do rendimento nacional disponível, enquanto os 20% mais ricos detêm mais de 40% desse rendimento. Quanto à mobilidade social, os dados da OCDE mostram que em Portugal pode demorar até cinco gerações para que os descendentes de uma família pobre atinjam o rendimento médio nacional.

Como é que a ineficácia do elevador social – ou, mais exatamente, a perceção dessa ineficácia – afeta o apoio dos cidadãos por mais intervenção do Estado na distribuição de rendimentos?

Em 2018, três economistas da universidade de Harvard procuraram dar resposta a esta questão. Nos Estados Unidos, o país do “sonho americano”, as preferências por redistribuição são menores. Já nos países europeus, onde a confiança no elevador social é reduzida, os cidadãos preferem níveis de redistribuição e intervenção pública mais elevados. Essas atitudes estão profundamente arraigadas nas diferenças históricas, cuja memória parece perdurar. Enquanto a Europa passou por séculos de regimes feudais, em que para se ser rico era preciso nascer rico, nos Estados Unidos as primeiras gerações de indivíduos endinheirados eram imigrantes que chegaram pobres à “terra das oportunidades”.

Portugal aparenta ser o mais europeu de todos os países da Europa. Num estudo realizado em setembro de 2019, replicando a análise dos economistas de Harvard para o caso português, comparativamente aos norte-americanos e aos nossos vizinhos europeus, constatamos que somos os que menos acreditamos que seja possível subir sozinhos. Em 2018, um relatório do Eurobarómetro mostrava que, em comparação com a média europeia, os portugueses mostram-se 38% menos confiantes na probabilidade de eles mesmos subirem na vida. Adicionalmente, em Portugal, factores como “ter sorte”, “ser de uma família rica” e “ter ligações políticas” são considerados mais importantes para ascender no elevador social, em comparação com os cidadãos de outros países da União Europeia.

Será que esta falta de confiança no elevador social se traduz num maior apoio ao Estado Social, em linha com os resultados dos economistas de Harvard? A resposta, no estudo que fizemos, é um definitivo ‘sim’. Os portugueses são fervorosos apoiantes de políticas redistributivas, tanto ao nível dos impostos (e.g. impostos progressivos sobre o rendimento, tributação sobre o capital), como ao nível da despesa pública (investimento público em educação, saúde e segurança social). Os dados do Eurobarómetro validam as nossas conclusões: 96% dos portugueses consideram que as diferenças de rendimento em Portugal são excessivas e 94% querem que o governo atue para mitigar esta desigualdade.

Portugal é ainda um país desigual e com fraca mobilidade social, como revelam os dados do Eurostat e da OCDE de 2018. Os dados que recolhemos antes da pandemia e os resultados do Eurobarómetro de 2018 mostram que os portugueses escolhiam responder às desigualdades com mais políticas públicas que promovam a redistribuição de rendimento, através de impostos e de mais despesa pública. Hoje, com o aumento dramático das desigualdades sociais, como vamos escolher mitigar as vulnerabilidades socioeconómicas sem precedentes que se avizinham? Com mais redistribuição, por favor.

 

O artigo exposto resulta da parceria entre o Jornal Económico e o Nova Economics Club, o grupo de estudantes de Economia da Nova School of Business and Economics.