As declarações do Presidente da República, no rescaldo das recentes eleições para o Parlamento Europeu, têm sido pouco felizes. Um eufemismo a que recorro pelo respeito devido à figura presidencial.
De facto, depois das apressadas contas de cabeça sobre a percentagem de portugueses que considerou pró-europeístas, puxou daquilo que designou por realismo para, numa intervenção na FLAD, dizer que havia uma “forte possibilidade de haver uma crise na direita portuguesa nos próximos anos” e que, por isso, o papel presidencial era “importante para equilibrar os poderes”.
Como fator explicativo da crise da direita indicou o aumento do número de partidos nessa área do expecto partidário e a “impossibilidade de diálogo entre PSD e CDS”. Uma explicação ao alcance de qualquer cidadão, sobretudo a parte inicial. Não é em vão que o povo criou – sem necessidade de autorização do então inexistente PAN – o provérbio «sete cães a um osso».
O problema veio a seguir quando Marcelo Rebelo de Sousa assumiu que tinha vindo da direita e que, por força das palavras anteriores, lhe cabia “não equilibrar” porque o Presidente “não pode ser oposição a nenhum Governo”, mas “ser muito sensível e sentir que é preciso ter um equilíbrio no sistema político”.
Certamente que não foi a circunstância de o Presidente estar a falar em inglês que fez com que os portugueses não tivessem percebido nada do que estava a dizer. Na verdade, esta é uma situação em que os desígnios parecem insondáveis face ao tipo de discurso utilizado.
A parte inicial parecia indiciar que o Presidente, ao recordar a sua família política, se estava a apresentar como a referência ou o novo representante da direita. Porém, a experiência do constitucionalista lembrou-lhe que entre as competências presidenciais não constava a capacidade de equilibrar e que, em nome da solidariedade institucional, não poderia liderar a oposição ao executivo.
Uma incongruência que ameaçava tornar-se num beco sem saída ou num discurso de onde a lógica se tivesse ausentado. Daí a frase final. Um enigma que provavelmente nem o próprio se revela capaz de decifrar. De facto, por mais voltas que dê, como explicar o que significa obter um equilíbrio sem equilibrar ou “ser muito sensível”?
É verdade que a sua presidência tem sido marcada pelos afetos, mas nem essa circunstância permite alcançar o sentido pleno da expressão presidencial. Algo que leva a questionar se a mesma tem efetivamente algum sentido.
Face ao exposto, será caso para questionar se Marcelo Rebelo de Sousa não está a ser vítima do mediatismo sem o qual tem dificuldades em viver. O excesso de exposição acarreta sempre efeitos secundários, seja no caso dos elementos da natureza, como o sol, seja no convívio humano.
O Presidente da Republica é o representante máximo da Nação e deve ser como que o seu espelho. Por isso, se o espelho reflete mas não fala, os portugueses esperam que, em todas as circunstâncias em que o discurso seja público, o Presidente reflita antes de falar. Porque o querem entender para perceberem se ele os entende.
Não foi o caso! Que a exceção não se transforme em regra!