Nas últimas semanas, a sociedade tem estado a debater a problemática da habitação. Até poderia parecer coincidência, mas não, o governo teve a capacidade de colocar na agenda pública e político-mediática a sua preocupação com as políticas de habitação.
Neste debate têm surgido críticas ou discordâncias e o debate pode estar a ser intenso, o que é natural nos sistemas democráticos, sobretudo quando o tema é do interesse de todos. O primeiro-ministro e a ministra da Habitação tiveram a coragem de apresentar propostas e dar a cara por elas, atraindo a atenção para um problema que todos sabemos que existe, mas que não estava no centro da vida pública e política. Durante décadas ninguém ousou atacar os problemas deste mercado onde, por exemplo, somos um país com menos habitação pública que os seus congéneres europeus.
Convidamos o leitor a uma reflexão. A realidade não é estática e está em permanente mudança. Se fizermos uma retrospetiva, no período da Troika, discutíamos como os bancos iriam resolver os seus problemas gerados pelos créditos hipotecários. A questão que se colocava era como se recuperavam as dívidas desses créditos, quando muitas delas eram superiores ao valor de mercado dos imóveis.
Isto obrigava os bancos a reconhecerem perdas por imparidade que depois os condicionavam na sua robustez financeira, mas também, a concessão de crédito às famílias e empresas. Muitos devedores, mesmo depois de venderem ou entregarem a sua casa ao banco para liquidarem as suas dívidas, não o conseguiam fazer porque as casas tinham perdido muito valor de mercado.
Saindo da bolha mediática, façamos um exercício. Não sendo desejável, imaginemos que daqui a dois anos a guerra da Ucrânia continua, com naturais consequências económicas. Nesse contexto, com alguma probabilidade as taxas Euribor continuam altas ou até sobem para conter o ímpeto inflacionista, e o nível de incumprimento de empréstimos tenderia a aumentar.
É um cenário hipotético, mas com probabilidade de ocorrência e para o qual devemos sempre estar preparados. Neste contexto, seria inevitável que os preços das casas caíssem abruptamente. Por isso, não achamos aceitável que se critiquem medidas que estão a ser tomadas com carácter de urgência, que servem para resolver um problema urgente.
O debate que importa ter é sobre o modelo que queremos para a nossa sociedade onde a habitação tem um papel central. E aqui, a medida verdadeiramente estruturante é aumentar o parque habitacional público a médio e longo prazo. Só tendo uma fatia importante de parque público, o Estado poderá influenciar o preço de mercado e prevenir ataques especulativos.
Em jeito de conclusão, deixamos uma questão para o leitor pensar: o Estado deve incentivar as pessoas a arrendar e não a comprar casa; deve dar créditos bonificados?