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Mercado nacional tem contornos de ativo de refúgio

As ‘yields’ do imobiliário português superam as de alguns dos principais índices bolsistas mundiais este ano, ficando atrás apenas dos retornos oferecidos pelos investimento em ativos do setor tecnológico e no ouro.
5 Outubro 2020, 13h00

A pandemia penalizou a maioria dos principais índices bolsistas mundiais nos primeiros nove meses do ano que, ou desvalorizaram, ou ofereceram rentabilidades inferiores a dois dígitos. Na Ásia, a bolsa de Tóquio perdeu cerca de 2%, enquanto a bolsa de Xangai subiu 5,51%, acima da bolsa australiana, que ganhou 3,33%. Do outro lado do mundo, no Brasil, o Bovespa afundou 18,20% e, mais a norte, o norte-americano S&P 500 avançou pouco mais de 4%, longe da valorizaram de 29% do ano anterior. Na Europa, o Stoxx 600, o índice que junta as maiores empresas europeias, tombou mais de 13%. Ainda assim, registou neste período um desempenho superior aos índices ibéricos – o PSI-20 caiu 22% e o espanhol Ibex 35 afundou quase 30%. A grande exceção entre os principais índices mundiais, claro, reside no tecnológico Nasdaq. Basta olhar para o índice que reúne o potencial das 100 maiores tecnológicas mundiais: mesmo em tempos de pandemia, o Nasdaq 100 subiu 30,75% e tudo indica que se aproxime da valorização de 38% registada no ano passado, a maior nos últimos cinco anos.

Outro ativo, imprescindível para a economia mundial, que foi fortemente impactado pela Covid-19 foi o petróleo – os contratos futuros chegaram mesmo a ser negociados a valores negativos por causa do excesso de oferta perante uma procura ‘inerte’ em abril. Entre janeiro e setembro, o Brent perdeu 38% e o WTI caiu 34%.

Como um barco a navegar à vista, os investidores procuram ativos de refúgio, não apenas numa lógica de diversificação de portefólio, reduzindo a exposição do investimento a perdas, mas sobretudo para o proteger e mesmo valorizá-lo. Uma das características destes ativos, do qual o ouro é o principal exemplo, é que têm uma valorização que é inversamente correlacionada com recessões económicas, por exemplo. Este ano, o ouro subiu mais de 22%, a maior subida dos últimos cinco anos.

É aqui que parece entrar o mercado imobiliário português. “Apesar do contexto adverso, 2020 não será claramente um ano perdido no mercado imobiliário”, diz Nuno Nunes, diretor de capital markets da CBRE Portugal. “O imobiliário é uma classe de investimento alternativo. Por isso capta um volume de investimento menos significativo do que as ações e obrigações. No entanto, a tendência global, que já se vinha a verificar antes da Covid, é de aumento do peso relativo do imobiliário sobretudo por se considerar um produto de “escape” em épocas de maior volatilidade”, adianta o responsável da CBRE Portugal.

Na mesma linha, Patrícia Barão, head of residential da JLL Portugal assinala que “o investimento em imobiliário residencial tem vindo a gerar cada vez mais procura como uma alternativa de investimento ao mercado de obrigações, ações e outros ativos financeiros de médio risco. Oferece maior retorno face ao baixo risco e menor variação do retorno face às restantes classes de ativos”.

Especializada no segmento comercial, a CBRE explica que as yields subiram 0,25% no segundo trimestre deste ano face ao período homólogo, em Lisboa e no Porto, para 4,25% e 6,25% respetivamente.

A Merlin Properties, uma Sociedade de Investimento e Gestão Imobiliária (SIGI) espanhola cotada em Espanha e em Portugal, partilha a mesma ideia. “As prime yields no imobiliário comercial variam desde 4% nos escritórios, passando por 5% nos centros comerciais até aos 6% na logística”, refere João Cristina, country manager da empresa.
No segmento residencial, apesar da redução de 11% do número de transações face ao ano passado, que foi um ano recorde com 178.700 transações, Patrícia Barão sugere mesmo que os preços foram “imunes ao vírus”. “Os dados relativos ao mês de agosto mostram que os preços de venda continuam a resistir, apresentando uma variação de 0,1% face a julho e um aumento de 11,7% relativamente ao mesmo período de 2019”.

Isso ajuda a explicar que, neste segmento imobiliário, “as yields de residencial mantêm-se entre os 3% e os 4% e têm sido estáveis ao longo dos anos”, adianta a head of residential da JLL Portugal.

“2020, no que respeita ao setor residencial, confirmou que tem sido dos mais resilientes aos efeitos negativos da pandemia: a procura continua elevada, não só porque o imóvel residencial é altamente versátil e permite vários usos, mas também porque a necessidade habitacional vai sempre existir; do lado da oferta, os projetos de construção não pararam e começamos a notar uma retoma de novos lançamentos”, explica Patrícia Barão.

 

SIGI — investir em ações imobiliárias
Há vários séculos que o pequeno aforrador pode ser dono do capital de empresas através da compra de ações. Uma SIGI segue a mesma lógica, adaptada ao mercado imobiliário, apesar “do investimento direto, através da compra de um imóvel, ter sido popular junto dos particulares e pequenos investidores”, afirma Nuno Nunes, da CBRE Portugal.
O mercado nacional conta atualmente com três SIGI – a Ores Portugal, do Bankinter e da Sonae Sierra, e duas dual listings espanholas, a Merlin Properties e a RSR, cotadas em Portugal e Espanha.

“Um dos maiores méritos das SIGI é o de permitir ao pequeno aforrador que quer exposição ao mercado imobiliário comprar uma ação em vez de um imóvel, sabendo que o seu investimento tem uma gestão especializada, é um investimento mais diversificado, e, ao ser cotado em bolsa, o investidor sabe quanto ‘vale’ a sua posição diariamente, logo é mais líquido”, diz João Cristina, country manager da Merlin Properties.

Além do investimento direto e das SIGI, há outras formas de investir no imobiliário em Portugal. “Por exemplo, os tradicionais fundos de investimento imobiliários e, de forma mais indireta, os fundos de fundos”, adianta Nuno Nunes.

“Apesar de várias características distintivas, estes veículos [incluindo as SIGI] têm algumas vantagens em relação ao investimento direto. As duas principais vantagens são permitir o acesso a imóveis de maior dimensão e de sectores a que tipicamente um pequeno investidor não teria acesso e permitir uma liquidez de investimento muito superior”, conclui.

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