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Milhões passaram por sacos azuis do GES com nomes de código de Pititi, Labutes, Jaguar, Pargo e Alforreca, entre outros

Despacho de acusação do processo que investigou a queda do BES detalha os beneficiários de pagamentos que foram feitos a vários funcionários do Grupo Espírito Santo, entre eles Ricardo Salgado, através de quatro empresas que funcionaram como sacos azuis: Espírito Santo Enterprises, Alpha Management, Clauster Limited e Balenbrook Investments.
  • Rafael Marchante/Reuters
15 Julho 2020, 12h03

O ex-presidente do BES, Ricardo Salgado, terá usado quatro empresas para pagar prémios e contrapartida a dezenas de funcionários e colaboradores do Grupo Espírito Santo, incluindo ele próprio. Os chamados sacos azuis, três empresas além da conhecida ES Enterprises, terão servido para transferências ocultas para que rendimentos não fossem detetados em Portugal. No despacho de acusação do processo BES/GES, Ministério Público diz que pagamentos eram ordenados por Salgado e eram feitos “de acordo com o grau de importância da sua participação nos atos criminosos que definiu e ordenou”.

A investigação levada a cabo pelo Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP) descobriu vários nomes de código e pseudónimo nas folhas de Excel com os pagamentos feitos a vários funcionários do GES, através da Enterprises e de outras três sociedades ocultas, que constam agora do despacho de acusação como beneficiários dos pagamentos de várias centenas milhões de euros realizados ao longo de vários anos.

A prática, segundo o despacho de acusação do caso BES/GES a que o JE teve acesso, terá permitido “desviar centenas de milhões de euros” quer através o caso azul, até agora conhecido, Espírito Santo Enterprises, quer através de outras sociedades como a Alpha Management, constituída em 11 de janeiro de 2013, nas Ilhas Virgens Britânicas (BVI), cuja  atividade foi encerrada a 06 de novembro de 2014, já depois da resolução do BES e do colapso do GES.

Sobre esta última sociedade, diz o MP, “a empresa foi deliberadamente omitida nos organogramas do GES. A participação sobre si detida [ESI BVI], também, não foi relevada em sede da preparação de contas da ESI BVI, ou da ESI”.

De acordo com o despacho de acusação, a atividade da Alpha Management “foi comandada” por Ricardo Salgado e pelo seu primo José Manuel Espírito, através de instruções dadas a José Castella (ex-controller financeiro do GES que, entretanto, faleceu) e a Jean-Luc Schneider (suíço e alto quadro do GES que apenas respondia Salgado), servindo-se por vezes do intermediário José Pedro Caldeira da Silva, que foi diretor-executivo do banco. Esta sociedade, segundo o MP, serviu para pagamentos ocultos a ex-administradores e antigos diretores do BES: “foi, assim, dotada de liquidez para fazer as transferências destinadas a Amílcar Pires, Isabel Almeida, António Soares, Pedro Costa, Pedro Serra e Rodrigo França”. Só Isabel Almeida, antiga directora do Departamento Financeiro, Mercados e Estudos (DFME) do BES, diz a acusação,  recebeu entre 2008 e 2012, mensalmente e em prémios, em contas tituladas por si, em Portugal e no estrangeiro, e em contas tituladas pelas suas filhas, menores à data, marido e pais, o valor global de 2,2 milhões de euros.

Segundo o MP, os funcionários do BES que estavam a par destes pagamentos terão usado “linhas de comunicação privadas, via private net, com o propósito de manterem oculta a prática criminosa, reiteradamente desenvolvida ao longo de anos”.

Na acusação é sinalizado que Ricardo Salgado “determinou o funcionamento da Alpha Management à imagem da Enterprises, como estrutura operativa em torno da movimentação de uma conta bancária, de recebimento e reencaminhamento de valores para terceiros, operações destituídas de interesse económico específico ou próprio associado ao seu objeto social”. O despacho dá conta que o mesmo acontecia com a Clauster Limited, criada no Belize, e que serviu para pagar a funcionários do GES mais de 4,5 milhões de euros, e com a Balenbrook Investments, criada nas Ilhas Virgens Britânicas, por onde passaram pagamentos a 15 funcionários do BES, entre eles Ricardo Salgado.

Os nomes de código. Salgado recebei dois milhões

Foram descobertos vários nomes de código e pseudónimos. Na lista, surge o filho de Salgado como o “Labutes” que recebeu mais de meio milhão de euros, através de transferências mensais feitas entre 2008 e 2014. João Freixa, antigo administrador do BES, era o Jaguar e recebeu, segundo o MP, mais de 500 mil euros em prestações mensais, entre 2008 e 2013.

São ainda identificadas, na acusação, pagamentos ao próprio Ricardo Salgado de dois milhões de euros. Segundo o MP, o ex-presidente do BES “não era credor da Enterprises. Na realidade era devedor a esta de dois milhões de euros, dos quatro milhões que no ano de 2009 a Enterprises transferiu para a Savoices (e dos quais devolveu dois milhões em 2012).

A secretária de Ricardo Salgado, Teresa Amorim, aparece também na lista como “Baixinho” que recebeu perto de 371 mil euros). Já Elsa Ramalho, que tratava das relações com os investidores, tinha o nome de código o Roadshow e recebeu 294 mil euros da Enterprises.

Também Isabel Vaz, CEO do grupo Luz Saúde, aparece na lista como “Pititi”, bem como o diretor do BES na Madeira que usava contas com os nomes de Pargo, Caramujo e Hanham, tendo recebido 1,1 milhões de euros da Enterprises, 477.500 euros da Alpha e 210 mil euros da Balenbrook. Já Pedro Cruchinho, que chegou a ser nomeado presidente da Comissão Executiva do Banco Económico em Angola (ex-BESA), tinha uma conta em nome de Alforreca através da qual recebeu 100 mil euros.

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