Carlos Moedas apresentou a candidatura do PSD à Câmara Municipal de Lisboa na passada semana e teve toda a atenção da comunicação social. Moedas criou expectativa porque o CDS e outros pequenos partidos da direita se apressaram a juntar-se à coligação, com a exceção da Iniciativa Liberal, que por momentos parecia querer entrar no barco. Imediatamente, jornais e televisões fizeram contas e vaticinaram que a direita tinha candidatura para chegar ao poder na capital.

Mas isso foi há uma semana.

A Iniciativa Liberal (IL) já anunciou que não apoiará Moedas, apresentando Miguel Quintas à corrida à câmara da capital. O candidato da IL foi entretanto apanhado em polémica por ter defendido a nacionalização da TAP quando o seu partido não só é contra, como faz disso a sua bandeira. Mesmo atrapalhada, a candidatura própria dos ultraliberais atrapalha as contas de Moedas.

De facto, a direita é minoritária na capital. O PSD teve 25% nas legislativas em Lisboa e 11% nas últimas autárquicas. O CDS simplesmente desapareceu das últimas sondagens e, sem o contributo da IL, a direita tem poucas chances de vencer a câmara. Aliás, a coligação PSD/CDS-PP/MPT/PPM já aconteceu por diversas vezes em autárquicas, pelo que Carlos Moedas afinal parece não conseguir agregar mais nada que se veja. Acresce a candidatura da extrema-direita que ainda complica mais as contas do candidato do PSD/CDS-PP.

Não se conhece nenhum trabalho de Carlos Moedas sobre Lisboa. O candidato do PSD/CDS-PP foi quadro da Goldman-Sachs, secretário de Estado da troika, Comissário Europeu e administrador da Gulbenkian, mas nunca se lhe conheceu uma posição sobre um qualquer tema relacionado com a cidade de Lisboa. Nada. Talvez por isso, na sua apresentação, tenha dito que vinha tratar das “pequenas coisas”.

Ora, quem tem conhecimento sobre a cidade sabe que as “pequenas coisas” que enunciou são da competência das Juntas de Freguesia. E alguém deve informar o candidato laranja que a capital enfrenta uma crise social enorme criada pela pandemia. São centenas de restaurantes e pequenos negócios em risco de fechar, milhares de refeições sociais distribuídas, desemprego e pobreza a afetar muitas famílias. Isto não é uma ‘pequena coisa’.

Quem fala de “pequenas coisas” não sabe o que se passa no terreno. Quem fala de “pequenas coisas” não compreende que, face à escassa resposta do Governo, têm sido as autarquias a tratar de aspetos essenciais do apoio social. Quem fala de “pequenas coisas” reduz a Câmara de Lisboa a uma gestora de arruamentos, sem saber o que fazem os seus trabalhadores e todas as organizações que, no terreno, são parceiras no trabalho social. Moedas não conhece Lisboa, muito menos a autarquia.

De resto, as pessoas sabem que, em tempos de crise, é um perigo ter a direita no poder. Na última crise, o governo que Carlos Moedas integrou, aliás em lugar de alta responsabilidade, decidiu ir além da troika. Desregulou os direitos de quem trabalha e generalizou a precariedade, a mesma que o PS ficou longe de resolver e que, ao primeiro sinal de crise, atirou milhares para o desemprego.

Moedas tem a sua assinatura na lei das rendas (que agora foi considerada inconstitucional), que atacava principalmente os mais velhos e esteve no governo que criou os vistos gold, esse passaporte para a corrupção e acelerador da crise na habitação. Finalmente, não podemos esquecer que Moedas tentou e quase conseguiu a privatização da Carris e do Metro, aumentando drasticamente o preço dos bilhetes e dos passes. Isso só foi impedido já em 2015, por imposição dos acordos do PS com o Bloco e o PCP.

A direita sentiu-se entusiasmada por ter um candidato conhecido, mas em apenas uma semana essa candidatura já perdeu muito fôlego. A coligação não alargou o que podia e não foi capaz de apresentar as principais linhas do programa. Aliás, não apresentou nem linhas de programa, nem uma ideia geral.

Lisboa enfrenta enormes desafios e qualquer candidatura que queira ser mobilizadora tem de ter resposta para a crise social e para a crise na habitação. Tem de querer combater as desigualdades e o racismo. Tem de ter uma visão forte para a mobilidade e as alterações climáticas e tem de ser intransigente na transparência e no combate à corrupção. A coligação PSD/CDS-PP de Carlos Moedas, tentando afastar a assombração pela memória da troika, não responderá a estas questões, perdida na sua agenda de pequenas coisas.