Ainda no rescaldo de mais uma COP onde a realidade do over promise e under deliver se fez notar abundantemente, gostava de contrapor esta letargia coletiva propondo que ambicionássemos alcançar a regeneração.

Por princípio e por definição a regeneração é uma forma única de pensar sustentabilidade. Se uma
empresa sustentável é aquela que não prejudica o meio social ou ambiental, a empresa regenerativa é aquela que injeta vida social e ecológica no meio onde habita, no lugar ou lugares que estão na base da sua operação.

Por não ser uma tarefa fácil nem sequer facilmente definível, faço uso de três imagens ligadas ao
imaginário que as palavras japonesas nos permitem, para melhor definir o que regeneração pode ser na prática.

A primeira palavra que quero trazer para o nosso imaginário regenerativo é Mottainai. Na sua essência Mottainai define todos os recursos como valiosos e de forma alguma imagina que algo possa ser considerado lixo ou descartável. Há uns anos atrás dois empreendedores decidiram criar um restaurante sem lixo, onde todos os recursos que entravam pela porta eram consumidos, transformados ou compostados. Esse restaurante chamado Kitchen Dates ensinou nos que a ideia de Mottainai poderia ser posta em prática de uma forma simples mas genial.

Uma perspetiva Mottainai vai para além de atribuir valor aos recursos centrando-se nas possibilidades que a sua existência nos oferecem. Mottainai também nos ajuda a compreender que tudo tem o seu lugar e que, de uma forma sistémica, todos os recursos – sociais, ambientais, culturais e financeiros – são necessários para que a empresa funcione em harmonia conseguindo regenerar ativamente os sistemas em que está envolvida. Uso a palavra harmonia para sublinhar o equilíbrio que sempre
é procurado pelas empresas que autenticamente procuram a regeneração. O equilíbrio do bem comum é uma tarefa inscrita no dicionário contemporâneo de gestão mas que muitas vezes é preterida por um conjunto pequeno de KPIs de sucesso.

A segunda palavra que quero trazer para o léxico de regeneração é Shinrin-yoku que literalmente significa banho de floresta. Este banho de floresta vai muito além de uma tendência de bem-estar onde o acesso ao verde é transformado em transacional. Nesta ideia, as organizações e as florestas co-regulam a saúde uns dos outros. Em vez de tratar a natureza como um pano de fundo Shinrin-yoku
lembra-nos da necessidade de biofilia autentica onde a relação com a floresta molda diretamente o bem-estar dos colaboradores, a criatividade e a viabilidade organizacional a longo prazo. Uma empresa holandesa chamada Interface há muito que incorporou a relação com a natureza como forma de expressar o seu valor económico e social.

Por último, gostava de lançar a palavra samurai. A palavra samurai é frequentemente reduzida a imagens de guerreiros e combate, mas o seu significado mais profundo olha para o lado da liderança servidora. Na sua essência, o ethos samurai diz respeito ao serviço disciplinado a algo maior do que a si mesmo: uma empresa, uma comunidade, um código, ou um ideal moral. Reinterpretado para
contextos contemporâneos, esta orientação pode ser reformulada como serviço à continuidade e ao florescimento dos sistemas vivos: organizações, comunidades e ecossistemas.

Uma leitura regenerativa de samurai desloca o foco do individualismo heróico para o cuidado. As virtudes classicamente associadas ao samurai, tal como honra, coragem, auto-contenção, responsabilidade e lealdade traduzem-se em comportamentos organizacionais onde os lideres assumem responsabilidade pelas gerações futuras, protegem os elementos vulneráveis do sistema e agem com
determinação e disciplina nas escolhas regenerativas do dia a dia. Um exemplo empresarial destes samurais regenerativos é a Patagonia, uma empresa de roupa e material desportivo que, num gesto único no mundo, tornou o planeta dono das suas ações.

Ao aproximar-se o princípio de um novo ano tento refletir no verdadeiro alcance que Mottainai, Shinrin-yoku e Samurai nos podem trazer especialmente na forma pessoal e organizacional como vemos a responsabilidade da regeneração. Creio que ter como objetivo injetar vida nos sistemas sociais, ambientais e económicos poderia ser um bom desejo para 2026.