A política é a arte de governar. Arte essa que deve constituir a mais nobre das atividades, pois visa a árdua tarefa de encontrar as melhores soluções para promover um território, seja país, região ou espaço mais restrito. Ao longo dos tempos, a arte deturpou-se, assumindo agora uma dimensão menor, onde se cruza o melhor e o pior das sociedades e, na evolução do fenómeno político, o encontro entre filosofia política e marketing trouxe ao de cima o pior dos protagonistas.

Numa eleição presidencial tão pouco motivante, foi penoso assistir na campanha à baixa qualidade das intervenções, com o recurso ao insulto e à má educação a constituir o método dominante na tentativa de captar a atenção.

A campanha nasceu sob o signo de um significativo consenso à volta de Marcelo, onde este, apesar de se assumir de centro-direita num país que vive nos últimos cinco anos numa manifesta tendência de esquerda, colhe apoios de todos os quadrantes. E tem tido momentos vergonhosos, onde os temas parecem saídos de manuais de nonsense, entre a baixeza de uns e o despropósito de outros, que lançam mão dos meios menos aceitáveis para captar a atenção dos eleitores.

Entre os atos indignos que arrastam a política para níveis inadequados, sobressai o ataque sistemático ao atual Presidente, em vez do recandidato. Nas intervenções públicas, cada candidato esforça-se para colar o Presidente ao Governo e atribuir-lhe a responsabilidade no descontrolo da pandemia. No debate na RTP, o alvo único foi o ataque ao único candidato que não estava fisicamente presente. Trata-se da maior confissão de derrota dos demais candidatos, incapazes de mostrar dimensão suficiente para o exercício do cargo.

Nesta campanha, temos os candidatos de direita que afirmam que Marcelo suportou a esquerda, e os candidatos de esquerda que o acusam de ser de direita. Imune às críticas, o recandidato limitou-se a ser Presidente. E demonstrou assim que, de todos os candidatos, é o único que o merece ser.

Claro que os eleitores de direita gostariam que ele tivesse dificultado a vida ao atual primeiro-ministro, embora a direita nunca se tenha mostrado capaz de criar uma alternativa nem programática, nem de qualquer sustentação eleitoral ou parlamentar. Os eleitores de esquerda, que apenas gostam de quem se afirma de esquerda, gostariam de o derrubar para alcançar o condicionamento absoluto do poder. Incólume, Marcelo será eleito à primeira volta, no período mais preocupante da nossa história recente, e terá pela frente a difícil tarefa de coabitar com um governo e uma esquerda em início de mudança de ciclo, que ocorrerá nos próximos cinco anos. A recuperação da pandemia e da economia ditarão a velocidade dessa transformação.

Até lá vale o esforço de construção de uma alternativa consensual e não radical. Até lá, valerá a apresentação de causas e projetos capazes de repor a esperança. Tal como há uma década foi pela mudança que o país saiu da crise, também agora será colocando a tónica no “mudar” que porá fim ao confinamento político à esquerda em que temos vivido.