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Muita conversa e pouca ação na cimeira ambiental da ONU

Líderes mundiais não evitaram continuar a ‘empilhar’ promessas numa altura em que é urgente agir para evitar danos irreversíveis.
29 Setembro 2019, 12h00

Os líderes políticos dos 193 Estados-membros das Nações Unidas (ONU) reuniram-se em Nova Iorque para a Cimeira da Ação Climática. O Secretário-Geral da ONU António Guterres convocou a reunião para 23 de setembro com o objetivo de pressionar os países a acelerar as suas ações individuais. As expectativas, para que fosse assinado um novo acordo e estabelecidas novas metas para a redução de emissões ou até que fossem apresentados resultados concretos não foram correspondidas. Porém, não faltaram discursos esperançosos e mais promessas por cumprir por parte dos líderes mundias.

O contraste entre o ritmo lento de ação e a urgência no problema foi relembrado pela ativista climática sueca Greta Thunberg, que criticou a abordagem dos líderes mundiais.“Negócios como sempre”, acusou.

“Os olhos de todas as gerações futuras estão sobre vocês. E se nos falharem, digo-vos que nunca vos perdoarei ”, afirmou a jovem no seu discurso de abertura da cimeira.

O relatório de 2018 do Painel Intergovernamental das Alterações Climáticas (IPCC), deixou claro que é necessário limitar o aquecimento global a 1,5 graus Celsius. Para isso, é preciso reduzir até metade as emissões de gases do efeito estufa (GEE) até 2030, uma meta que está muito além dos compromissos atuais da maioria dos países. “Não haverá soluções ou planos apresentados de acordo com os números de hoje”, disse Thunberg. “Porque esses números são muito desconfortáveis. E vocês ainda não são maturos o suficiente para dizerem as coisas tal como elas são”, criticou.

Os compromissos anunciados durante a cimera foram uma atualização das promessas já feitas em 2015, quando 195 países assinaram o o Acordo de Paris. Até agora, 65 anunciaram esforços para atingir emissões líquidas zero até 2050, mas aos olhos dos especialistas, esse trabalho não vai ser o suficiente.

Os EUA, a Índia e a China são os maiores emissores mundiais de GEE que contribuem para o aquecimento do planeta, portanto, os seus compromissos têm um maior impacto na prevenção de uma crise climática.

Donald Trump já anunciou que planeia abandonar o acordo, e não é tímido no que toca ao seu ceticismo face às alterações climáticas, mas mesmo assim decidiu compararer na cimeira. Porém, a sua participação foi curta, e passados 15 minutos, abandonou as instalações.

O primeiro-ministro indiano Narendra Modi anunciou que vão ser duplicadas as metas para a utilização de energia renovável no país para um teto de 450 gigawatts. Apesar de ser uma boa notícia, os planos não incluem um cronograma concreto ou o compromisso de elevar as metas oficiais de redução de emissões de carbono, o que deixou muitos críticos de pé atrás.

Já a China destacou o ritmo a que o governo tem vindo a trabalhar de modo a cumprir os objetivos atuais, mas também não sinalizou exatamente como poderia elevar ambições no seu plano climático no futuro.

Quem se junta agora a este trio é a Russia, que apesar de nunca ter manifestado interesse em trabalhar em prol do ambiente, anunciou durante a cimeira que se vai comprometer ao Acordo de Paris. Contudo, sem dar mais informações sobre como planeia reduzir as emissões de GEE oriundas da grande industria de petróleo do país.

Estas atualizações não foram suficientes para tranquilizar os ativistas ambientais que estavam presentes na sala, numa altura em que decorrem greves climáticas, catástrofes naturais mais agravadas, e os governos são cada vez mais pressionados em declarar emergência climática.

Marcelo Rebelo de Sousa, foi um dos oradores desa reunião e deixou claro que a falta de inação não se verifica em Portugal. “Nós fomos os primeiros a comprometer-nos a ser neutros em carbono até 2050, adotando e implementando o Roteiro para a Neutralidade Carbónica 2050 como estratégia de longo prazo para a redução das emissões de gases com efeito de estufa, que apresentámos com um ano de avanço”, afirmou, perante dezenas de líderes mundiais. “E por uma simples razão: porque não há Portugal B, e não há planeta B“, acrescentou.

Na sua curta intervenção, Marcelo apresentou de forma sintética o Roteiro para a Neutralidade Carbónica 2050 que foi aprovado em Conselho de Ministros na sua versão final em junho deste ano, depois de um período de discussão pública.

Em linha com o discurso esperançoso, Angela Merkel usou os seus 20 minutos para fazer um apelo aos “céticos” do aquecimento global. No seu discurso, a alemã enfatizou a necessidade de os países trabalharem juntos e “seguirem os conselhos da ciência” sobre as alterações climáticas. “Existem pessoas que são ativas, demonstram e pressionam, mas também há quem duvide, e é o dever de todo governo trazer todos juntos”, afirmou Merkel, no momento em que anunciou um novo plano climático do governo alemão de 60 mil milhões de euros para acelarar a transição para energia limpa nos próximos 10 anos.

A cimeira terminou e o sentimento de urgência continou no ar. O planeta continua a aquecer, os glaciares a derreter e os níveis do mar a sobem ao mesmo tempo. A temperatura atual do planeta situa-se nos 1,1 graus Celsius e a Organização Meteorológica Mundial já alertou que, a este ritmo, as temperaturas deverão chegar aos 3 graus Celsius, até ao final do século.

“Eu não estarei cá para ver, mas as minhas netas e os vossos netos estarão”, afirmou António Guterres. “Recuso-me a ser um cúmplice na destruição da única casa deles”.

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