“Quando impedem as pessoas de vir ao vosso país, magoam-se mais do que as pessoas que são alvo destas medidas”. São palavras de Taleb Rifai, o Secretário-Geral da Organização Mundial de Turismo, e parecem ser uma resposta às manifestações anti-turismo. Deixem-me, então, completar a citação com a parte inicial: “As pessoas vão continuar a viajar de qualquer maneira. Tornou-se um modo de vida, tornou-se um direito. Por isso, a nível internacional não vai ter impacto. No entanto, acreditamos que, se essas políticas de vistas muito curtas continuarem, vão-se virar contra os Estados Unidos. Se construírem um muro, vão isolar-se a si próprios, não os outros.”

Ah, era uma crítica à atitude norte-americana face à imigração… Num texto caricatural, Carlos Guimarães Pinto defende que ambos discursos, anti-turismo e anti-imigração, são facilmente duas faces da moeda da xenofobia. Tenho quase a certeza de que não é isso, porque a nacionalidade mais representada entre os hóspedes de Portugal é a portuguesa e eu não acredito que os “turismofóbicos” repudiem os turistas em função da sua proveniência, é mais pelo que calçam. Uma demonstração de snobismo, portanto, como sustentei no meu último artigo.

A propósito desse meu texto de há duas semanas, alguém comentou que o turismo não é o “mar de rosas” que se pensa. A rosa é bastante bem escolhida para metáfora, na verdade: está entre as flores mais populares, assume muitas cores, serve para fazer tónico facial e… tem espinhos. O debate está entrincheirado, como agora parece estar todo e qualquer debate.

Eu fico em “terra de ninguém”. Como economista que sou, sei que não há benefícios sem custos (e vice-versa). No caso do turismo, o elenco deles e o respectivo balanço depende em boa medida da etapa do ciclo de vida em que o destino se encontra. Na minha perspectiva, estamos num estádio em que o saldo é positivo e o facto de termos chegado mais tarde ao fenómeno do turismo internacional permite-nos aprender com os erros alheios, escapando-lhes. Evitar os erros, não o turismo.

Ao The Guardian, Taleb Rifai disse que os episódios recentes em que os turistas são mandados de volta para as suas terras (onde é que já ouvimos o slogan?) são para ser levados a sério, mas que a solução não passa por combater a actividade, antes por promovê-la de modo sustentável. Concordo. E entendo que a diversificação é fundamental (eu sei que há gestores premiados e condecorados que não acham essa estratégia tão importante). E, se, de facto, ao longo dos tempos a oferta se diversificou em termos de produtos, geograficamente a procura continua muito concentrada, o que torna o turismo menos capaz de contribuir para a coesão territorial. Por outro lado, a quem argumenta que os benefícios gerados pelo turismo estão apenas nas mãos (ou contas) de alguns, eu respondo que a melhor forma de resolver os eventuais problemas de distribuição não é acabar com a actividade que gera riqueza. E o turismo gera-a.

Na Grande Guerra, a fase das trincheiras foi a mais mortífera. Uns anos antes, a 28 de Fevereiro de 1906 – uma boa candidata a data fundadora para o turismo em Portugal –, tinha sido criada a Sociedade de Propaganda de Portugal. Os seus membros, republicanos e monárquicos, católicos e maçons, souberam pôr de lado as profundas diferenças ideológicas, animados pelo ideal de “promover o desenvolvimento intelectual, moral e material do país e, principalmente, esforçar-se por que seja visitado, admirado e amado por nacionais e estrangeiros”. Saibamos, pois, recuperar essa sabedoria.

A autora escreve de acordo com a antiga ortografia.

 

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