Os ativos por impostos diferidos não dependem de lucros futuros, até porque a Associação Mutualista Montepio Geral não tem em vista o lucro. Trata-se de diferenças temporais.
No plano contabilístico das entidades da economia social, todas as entradas de poupanças são proveitos e só os reembolsos (devolução aos associados) são custos. “Isto é, quando há recebimento de poupanças cria-se uma provisão técnica para garantir esta responsabilidade. A provisão é aceite como custo noutros sistemas contabilísticos, mas neste, dada a nossa natureza, não é. O custo só é aceite pelas autoridades fiscais quando há reembolso, o qual ocorre a três, cinco, oito, 10 e 30 anos”, disse Virgílio Lima, na conferência de imprensa em Lisboa, após na terça-feira à noite os associados terem aprovado as contas da mutualista de 2019.
Deste modo, diz a Associação Mutualista Montepio Geral, esta entidade tem de liquidar IRC no momento inicial, porque as provisões técnicas não são aceites como custo. No entanto, quando o reembolso da poupança é feito, a instituição recupera o IRC que pagou anos antes. É a isto que se chama “diferenças temporárias” e são essas diferenças que deram origem aos Ativos por Impostos Diferidos.
Recorde-se que a PwC aprovou as contas com uma reserva que traduz um desacordo na contabilização dos Ativos por Impostos Diferidos (833 milhões) por causa da recuperabilidade desses impostos diferidos.
A opinião com reserva surge por desacordo relativamente ao registo dos Impostos diferidos por a PwC considerar que parte substancial dos mesmos poderá não ser recuperável.
A Mutualista paga IRC no momento inicial e fica com o direito de recuperar esse imposto, anos mais tarde quando o Associado levanta a sua poupança e isso é um ativo (direito a recuperar).
O balanço da MGAM inclui no ativo montantes de 833,3 milhões de euros e 816,8 milhões em 31 de dezembro de 2019 e 31 de dezembro de 2018, respetivamente, “relativos a Ativos por Impostos Diferidos originados, essencialmente, por diferenças temporárias dedutíveis respeitantes à constituição de provisões técnicas, cuja base tributável ascende a cerca de 3.030 milhões de euros, em 31 de dezembro de 2019”, refere a Mutualista no relatório e contas.
Esse valor inclui uma pequena parte de prejuízos fiscais reportáveis de cerca de 70 milhões, e que esses sim dependem de lucros futuros. Os restantes impostos não são recuperados por via dos resultados porque as associações não visam o lucro, mas são recuperados por via dos reembolsos (diferenças temporárias), no encontro de contas entre os impostos a pagar nesse ano (resultante de novas subscrições, e o valor do ativo a recuperar (com os reembolsos).
Virgílio Lima realçou que a PwC não questionou a legitimidade da constituição desses DTA (Ativos por Impostos Diferidos), mas interpreta que a recuperação dos impostos não pode ser feita pela mesma atividade, “o que é estranho”, pois é esta a única atividade que a Mutualista tem, disse.
Portanto a PwC aceitam como legítima a constituição destes ativos por impostos diferidos gerados pelas diferenças temporárias. Mas, com base na IAS 12, mostram desacordo quanto à sua recuperabilidade. “A PwC conclui que a recuperabilidade dos impostos diferidos não pode ser feita pela mesma atividade que a provocou, porque no seu entender há um revolving. Na verdade não é porque os mesmos associados colocam mais ou menos poupanças, alguns saem e outros entram. No quadro dos 600 mil associados nós temos uma erosão natural, em função do ciclo de vida, em função da transformação de associados em pensionistas. Não temos outra atividade”, disse o presidente da Mutualista.
“Em conformidade com a norma internacional de contabilidade IAS 12, Impostos sobre o rendimento, a recuperabilidade de ativos por impostos diferidos deve ser avaliada em função da obtenção de resultados tributáveis, os quais deverão ser projetados excluindo as componentes tributáveis originadas por novas diferenças temporárias dedutíveis”, lê-se no parecer da PwC anexo às contas individuais da Associação Mutualista Montepio Geral (MGAM).
“Tendo por base as projeções apresentadas pela Administração e as condições previstas na referida norma, a MGAM não demonstra capacidade para gerar resultados tributáveis suficientes que permitam recuperar parte substancial dos ativos por impostos diferidos registados”, considera a PwC.
“Desde logo a recuperabilidade desses impostos por diferenças temporárias não depende de lucros futuros. Nós não visamos o lucro. Temos uma exploração equilibrada quando temos zero. Quando temos excedentes, estatutariamente estamos obrigados a distribuir esses excedentes aos associados em cada ano, sob a forma de melhorias, aumentando as responsabilidades junto deles e capitalizando esses valores. Isto depois da constituição das reservas obrigatórias que pretendem defender essas situações”, disse Virgílio Lima. Os DTA recuperam-se pelos reembolsos das aplicações dos clientes.
Desta forma, os ativos por impostos diferidos e os capitais próprios, incluindo o resultado líquido do exercício, constantes do balanço da MGAM em 31 de dezembro de 2019 e 31 de dezembro de 2018, “encontram-se sobreavaliados por um montante materialmente relevante, a magnitude do qual não estamos em condições de quantificar, dada a incerteza inerente às projeções dos resultados tributáveis”, defende a PwC.
Reservas são situações relatadas pelo auditor que afetam a sua opinião. Mas há também ênfases que designam situações que não modificam a opinião do auditor. A ênfase, como o próprio nome indica, pretende enfatizar um determinado aspeto das demonstrações financeiras, considerado relevante.
A Associação Mutualista pediu entretanto à BDO um parecer sobre a recuperabilidade dos ativos por impostos diferidos e esta auditora concluiu que os atuais DTA relacionados com as Provisões Matemáticas (ou seja, diferenças temporárias) serão recuperadas com os reembolsos dos próximos 6 ou 7 anos.
A BDO disse ainda que desde a constituição dos DTA já se tinham recuperado cerca de metade desses ativos por impostos diferidos então constituídos.
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