(À laia de disclaimer explicativo: quando fui directora do jornal da minha escola secundária, escolhi como título exactamente o mesmo que passa agora a encabeçar estas linhas. Às vezes, por mais voltas que a vida finja nos dar, percebemos que a essência das pessoas não muda. Opto, como o Nuwanda do “Clube dos Poetas Mortos”, por andar desalinhada e não seria eu se o meu caminho não fosse feito, maioritariamente, contra a corrente.)
Vivemos nuns tempos especialmente complexos, em que, por tudo aparentar estar disponível, o essencial tende a escapar-nos. Estamos inundados de pretensa informação diariamente e, contudo, todos os dias concluímos que só nos chamam para pagar a factura final e o que é realmente importante apenas nos é dito nesse exacto momento.
Um dos meus escritores preferidos, Oscar Wilde, escreveu há duzentos anos que “a diferença entre a literatura e o jornalismo é que o jornalismo é ilegível e a literatura não é lida”. Passaram mais de dois séculos e o livro em causa resistiu mas das notícias daquele dia não há memória.
Recordei-me desta mesma frase ao assistir a um espectáculo televisivo, uma vez mais servido como se tratasse de informação, onde uma Senhora, que se apresenta frequentemente de pistola ao peito e se afirma “procuradora”, disse, entre erros inadmissíveis, um sem número de banalidades. Independentemente da maior ou menor simpatia que a própria possa merecer, importa que se assinale que a sua aparição televisiva na auto-invocada qualidade de “procuradora” não pode ser minimamente confundida com informação e, menos ainda, com jornalismo.
Independentemente de lhe reconhecer o direito a dizer todas as barbaridades, incluindo jurídicas, que entenda. Se calhar, principalmente por causa disso. Só não lhe chamem informação porque, do pouco que vi, trata-se de ajustes de contas que deviam ter lugar noutra sede.
Dito de outra forma, quem vê os actuais meios de comunicação social dificilmente se deparará com o que é a sua função essencial, estando quase todos ao serviço de interesses que, para os comuns mortais, são inacessíveis. Em meu abono, julgo, declaro que nada tenho contra o entretenimento mas tenho tudo contra agendas ocultas travestidas de informação. E é o que temos actualmente, a par da escravidão pelas ditas audiências, num caminho que, mesmo sem nos apercebermos, termina no abismo e na ignorância.
O dever/direito à informação é demasiado sério para se compadecer com tais agendas, com os arranjos, com o não pensar nos meios para atingir os fins. É demasiado sério para a exploração da vida privada, para a insinuação torpe, para a exposição sistemática de menores. Cada vez que paramos a assistir, cada vez que não mudamos de canal, cada vez que não sustemos a curiosidade mórbida de ver mais uma vida devassada, não somos cúmplices. Somos autores morais da nossa própria desgraça. E, um dia, podemos ser nós.
A autora escreve de acordo com a antiga ortografia.