Na relação de Portugal com os investidores na dívida pública portuguesa, o problema não é de confiança – certeza, credibilidade, familiaridade – ou ausência dela. O problema de Portugal não se situa ao nível de maior ou menor confiança. Confiança verdadeiramente nunca existe, porque o risco e a incerteza ninguém pode eliminar. Reagan dizia em relação ao cumprimento dos tratados de não proliferação nuclear pela URSS: “Trust but verify” (confiar mas verificar). Ou seja, nós confiamos, mas na verdade desconfiamos.

Os mercados conhecem-nos, desde há muito, e não alimentam esperanças infundadas. Disse Horácio:Vita summa brevis spem nos vetat incohare longam (a brevidade da vida impede-nos de alimentar esperenças vãs). Quando os mercados falam, aumentando o juro, estão a dizer-nos que não alimentam esperanças vãs quanto à nossa capacidade para sair do beco, mas que se vão aproveitar da nossa debilidade de financiamento em melhores condições para sacar mais umas massas.

As taxas de juro cobradas à República, ou seja, a cada um de nós, subiram acima dos quatro por cento. São mais elevadas que as de Espanha ou Irlanda e muito mais que as da Alemanha, porque na relação dos investidores com a dívida pública portuguesa predomina a desconfiança – suspeição, ceticismo, dúvida. Os mercados funcionam com facta, non verba. Factos, não palavras. E os factos – as decisões políticas (ou falta delas) e as estatísticas – não incutem redução da desconfiança, mas sim o seu recrudescimento.

Quando a atual solução governativa tomou posse, os arautos da desgraça previram que, a prazo, as taxas de juro iriam subir. Infelizmente, a profecia concretizou-se. É difícil entender como é que o Presidente da República e o primeiro-ministro conseguem dizer que a subida das taxas de juro não são um problema, que são o resultado de uma externalidade. Na verdade, é acima de tudo o resultado de uma internalidade. E parece não terem presente que, desde logo, é um problema para cada um de nós, contribuintes. É obrigatório que os poderes eleitos falem verdade aos portugueses.

É claro que o argumento a favor da estabilidade governativa já não convence os mercados. É certo que a estabilidade é conveniente, mas induz complacência e pode – está – a conduzir à paralisia. Será que a estabilidade é mais valiosa que a penúria que nos é infligida, cada vez com maior ferocidade, pelos mercados desconfiados? É preciso encontrar rapidamente outra solução que estanque a hemorragia da pouca riqueza que produzimos para os cofres dos credores.

Os portugueses, ou seja cada um de nós, também somos responsáveis pela enorme dívida, que não é apenas pública. É espantoso como os portugueses poupam cada vez menos. Muitos não terão nada para poupar e outros continuam a endividar-se penosa e sofregamente para comprar carrinhos, carros e carrões – em vez de optarem pelo investimento produtivo. Temos de ser contidos e amigos dos nossos pais, filhos e netos. É preciso parar e pensar – que futuro para eles?

 

PS: Se me é permitido, sugiro que o Primeiro Ministro aperfeiçoe (meia-hora por dia) a fluência da língua inglesa. É mais eficaz externamente e dá o exemplo internamente.