Um deputado do Bloco de Esquerda renunciou ao seu mandato de deputado na Assembleia da República e pediu desculpas por ter sido reembolsado por despesas que fez e para as quais já havia recebido um subsídio da própria Assembleia. Diz-nos o mesmo deputado que acha que o seu comportamento não foi correto e entende que deve renunciar “por considerar que o exercício do mandato parlamentar tem de ser pautado pelo mais absoluto rigor e por inabaláveis princípios éticos”. Fez o deputado muito bem, e veremos se os outros nas mesmas circunstâncias o fazem.

Há situações passadas noutros países que são semelhantes. Recentemente na Irlanda, a ministra da Proteção Social Regina Doherty foi questionada por ter recebido indevidamente um subsídio quando era o chicote-mor do Governo – o Chief whip é o deputado que zela pela presença dos outros deputados do partido nas votações e discussões parlamentares (e de acordo com a posição do partido), numa combinação entre charme e força bruta em partes que não têm que ser iguais. O nome vem de controlar e foi o primeiro nome dado ao volante dos carros por desempenhar o papel do chicote nas carruagens e carroças.

Ora, foi-lhe indevidamente processado um suplemento por ser super junior minister, isto é, por sentar-se nas reuniões de gabinete, embora sem direito a voto. O problema é que este suplemento só pode ser pago a dois ministros e estes super junior ministers eram quatro – situação inédita e que os serviços não se haviam dado conta. A senhora Doherty imediatamente se prontificou a devolver as verbas indevidamente recebidas.

No caso dos nossos deputados, claro que as coisas tiveram outro tratamento. No tocante ao PS, a resposta dada é que estes pagamentos não são ilegais, o que quer dizer que consideram correto ser reembolsado por uma despesa que não se teve – este problema não é, portanto, mais que uma subtileza, um preciosismo ou mesmo uma chinesice.

O PSD resolveu fazer “um pedido urgente de parecer à Comissão de Ética da Assembleia da República. São regulamentos que não dependem do grupo parlamentar, dependem da Assembleia da República”. Parece-me bem pedirem um parecer, e já agora que o façam os mais conhecedores da matéria, os visados – para depois poderem pedir outro parecer à Comissão de Ética para saber se eles podiam ter feito o parecer; com sorte, chegamos ao fim da legislatura.

O PCP requereu uma clarificação sobre o regime aplicável às viagens dos deputados da Madeira e Açores – pelos vistos, ainda estão a tentar perceber o que está a acontecer, devem ter votado distraídos este regime. Por outras palavras, vamos ter mais um caso de “death by committee”.

Vamos ver como isto vai acabar. Ainda vamos ter uma Resolução da Assembleia a dizer que pode haver duplicação porque há a ida e a volta, e a duplicar também o subsídio de refeição, pois todos os dias temos almoço e jantar. Depois disto, está criado o caso para triplicar os subsídios na Assembleia, pois como é sabido, “não há dois sem três”.