Uma das primeiras ideias que se transmite a todos os que se iniciam na ciência económica é a de que “não há almoços grátis”, no sentido de que para que possamos obter algo de que gostamos temos de prescindir de outra ou outras coisas que também nos agradariam. A economia é uma ciência que se debruça sobre as escolhas que somos obrigados a fazer face à escassez dos recursos e à multiplicidade de necessidades que temos que satisfazer.

Se alguém, individualmente, não paga nada para obter um bem ou um serviço é porque outro ou outros, normalmente, a sociedade, suportam o custo desse bem ou serviço.

A expressão “não há almoços grátis” parece encontrar a sua origem nos bares do Velho Oeste dos Estados Unidos, que forneciam comida muito salgada de graça para clientes que tinham comprado pelo menos uma bebida, que custava mais cara do que o habitual. Aqueles que aceitavam “a oferta” acabavam por comprar ainda mais cerveja, na tentativa de eliminar a sede gerada pelo alimento que lhes havia sido posto à frente.

A frase ganhou, no entanto, fama pela pena do Nobel da Economia Milton Friedman, que a utilizou como título do seu livro de 1975 There’s No Such Thing as a Free Lunch, no qual descrevia a ideia de custo de oportunidade, segundo a qual para podermos ter uma coisa de que gostamos temos de prescindir de uma outra coisa também por nós apreciada.

Vem isto a propósito da medida adotada pelo governo socialista, em 2016, de estabelecer, no ano letivo 2016/2017, a gratuitidade dos manuais escolares para os alunos do 1.º ano do primeiro ciclo, medida alargada, em 2017/2018, a todas as escolas públicas do primeiro ciclo e, em 2018/19, aos alunos do segundo ciclo, esperando-se que até ao final da legislatura todos os alunos das escolas públicas até ao secundário tenham acesso a manuais escolares gratuitos.

Apesar do aparente carácter social de uma medida desta natureza, o certo é que ela, na prática, acaba por prejudicar as famílias mais carenciadas, uma vez que, como é fácil de explicar, pelo princípio atrás enunciado, os manuais escolares não são grátis, uma vez que as editoras têm, naturalmente, de se fazer pagar pelos livros que dão à estampa.

Assim, o que acontece é que, não pagando as famílias que têm crianças a estudar nestes níveis de ensino pelos manuais que os seus filhos utilizam nas escolas, teremos que ser todos nós, através dos nossos impostos, a suportar este custo.

Ora, se considero mais do que justo que os manuais sejam atribuídos gratuitamente a todas as famílias carenciadas, ainda que se adote um critério generoso na definição de carência económica, capaz de permitir a elegibilidade de mais famílias, já me parece totalmente disparatado que sejam todos os contribuintes, mais ou menos endinheirados, a suportar a gratuitidade dos manuais escolares dos filhos das famílias ricas.

Significa isto que a gratuidade universal dos manuais escolares, ainda que limitada às escolas públicas, implica o resultado pernicioso de todos terem que suportar os custos dos manuais escolares de ricos e pobres, quando seria possível adotar uma medida socialmente muito mais justa de conceder este benefício apenas às famílias cuja capacidade contributiva ficasse aquém de um determinado limiar.

A gratuidade universal é uma medida mais populista, mais eleitoralista, mas menos justa, podendo, no limite, significar que todos, mesmos os mais pobres, pagamos os manuais escolares dos filhos das famílias mais ricas do nosso país, bastando, para tal, que as mesmas coloquem os seus descendentes a estudar em escolas do ensino público.

Como os recursos do Estado são finitos e podem ter destinos muito diversificados, para satisfazer as inúmeras necessidades dos cidadãos, fica por saber quais são as reais escolhas que um governo dito socialista pretende fazer. Se, à semelhança do que aconteceu com a extinção da sobretaxa, pretende, por razões de simples marketing político, poder apregoar a eliminação de medidas de austeridade emanadas do anterior executivo, ainda que estas sobrecarregassem, apenas, os mais afortunados, ou se, através de políticas dignas da ideologia que defende, quer auxiliar os mais pobres, fazendo os mais ricos pagar os almoços dos mais carenciados.

Como não há manuais grátis, o governo tem de conseguir explicar aos portugueses qual a razão pela qual devem, através dos seus impostos, suportar, por igual, os custos de uma parte da educação de ricos e de pobres.