Hegel escreveu que a história se repete, pelo menos sempre duas vezes, tendo Marx acrescentado que a primeira como tragédia e a segunda como farsa. A história que vos trago é demonstrativa do que está a ser uma tragédia e a esperança que vos deixo é que, desta vez, se consiga desmantelar a farsa.
Entretidos que andamos à pesca de casos do famoso vírus entre nós, a esmagadora maioria nem se terá apercebido que os estivadores de Lisboa iniciaram uma nova greve, no que estão a ser secundados por profissionais de outros portos.
Antes que venha a conversa já usual sobre as greves deste sector, normalmente acompanhada da proliferação de rumores falsos, em especial que os estivadores auferem 5000,00 mensais, importa que se atente na sua história.
Depois de umas complexas negociações, feitas com o seu sindicato a arcar perante a opinião pública de todos os males do país, através de uma tão concertada quanto falsa campanha contra aquele, o que é certo é que a sua empregadora nunca cumpriu aquilo a que se obrigou. A título de mero exemplo, até há uns dias atrás, em 2020, os estivadores tinham, apenas, recebido 390,00 de salários, a que se somaram 170,00, pagos no dia anterior ao que a sua empregadora se apresentou à insolvência.
Por seu turno, para que se perceba de uma vez por todas como funciona o sector portuário, estes estivadores são contratados por uma ETP (empresa de trabalho portuário), sendo que os eventuais são contratados ao dia, sabendo na véspera se têm (ou não) trabalho. Mas a cereja no bolo é que, por sua vez, esta ETP é constituída pelas próprias empresas de estiva que recorrem à mesma para a mão-de-obra necessária à movimentação de cargas em cada um dos portos.
Qual é o fundamento da apresentação à insolvência da ETP poderão perguntar os mais incautos? Entre os motivos avançados, pasme-se, pode ler-se que os clientes da A-ETP ( isto é, a empregadora dos estivadores de Lisboa) não têm pago atempadamente, sendo que, por mera ironia do destino, os devedores da mesma serão, justamente, as ditas empresas de estiva que a constituem.
Dito de outra forma, uma Olívia patroa (vulgo, empresas de estiva, cujos lucros são na razão de milhões de euros) facilmente cria prejuízos a uma Olívia ETP, à laia de farsa. E, por outro lado, quem incumpriu ostensivamente aquilo a que se obrigou foram as empregadoras, nem sequer pagando os salários a que se obrigaram, sob o beneplácito do Governo que nada faz.
Este é, pois, um bom para se ver se a frase de Costa de “palavra dada ser palavra honrada” tem algum espectro de aplicação ou se, uma vez mais, se trata, também, de uma farsa.