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Nicolas Namias quer transformar o BPCE num gigante bancário europeu mas enfrenta obstáculos

A operação policial no Novobanco, no âmbito de uma investigação sobre suspeitas de corrupção num antigo negócio imobiliário, e a crescente oposição à fusão entre a Natixis Investment Managers e a GIH lançaram uma sombra sobre o que seriam dois dos maiores negócios do setor financeiro na Europa. O BPCE tem ainda de lidar com os lesados do BES que já lhe foram bater à porta.
9 Dezembro 2025, 14h43

O CEO do BPCE, Nicolas Namias, enfrenta alguns obstáculos sérios ao tentar concretizar um enorme plano de expansão através de fusões e aquisições. Nicolas Namias quer que o BPCE se torne um importante banco da Europa e que se torne no novo ator europeu no financiamento da economia europeia. Mas há pedras no caminho.

Nicolas Namias tem estado numa onda de aquisições por toda a Europa, tendo fechado um acordo para a compra do banco de retalho português Novobanco por 6,4 mil milhões de euros, adquirido a divisão de leasing de equipamentos da Société Générale na Alemanha e fechado um acordo para fundir a Natixis Investment Managers com a divisão de gestão de ativos da Generali, tudo isto este ano.

Mas o Grupo  bancário francês que adquiriu o Novobanco enfrenta desafios na fusão da Natixis IM com a Generali Investments Holding devido a preocupações do governo italiano. O Governo de Giorgia Meloni tem-se oposto ao avanço desta operação. Um dos argumentos apresentados, revelou o FT, prende-se com o facto de a Generali ser a maior adquirente de dívida pública italiana, levando a críticas de que esta fusão pode colocar em causa a soberania da dívida pública. Isto já foi contestado por Namias, que afirma compreender a preocupação, mas acredita que o” projeto reforça a soberania financeira de Itália, França e da Europa”.

A parceria BPCE e Generali tem como objetivo criar a maior gestora de ativos da Europa através de uma joint venture que combina a Natixis Investment Managers (do BPCE) e a Generali Investments Holding, formando uma entidade com cerca de 1,9 triliões de euros em ativos sob gestão, tornando-se um player global e líder europeu em receitas no setor.

O projeto envolve a criação de uma nova empresa com participação igualitária (50/50) entre os dois grupos, mas enfrenta desafios regulatórios e de acionistas na Itália, embora os grupos tenham retirado uma cláusula de 50 milhões de euros em caso de desistência, indicando um progresso contínuo na fusão.

A crescente oposição italiana à fusão entre a Natixis Investment Managers e a GIH lançou uma sombra sobre o que poderia ser um dos maiores negócios transfronteiriços do sector. Os negócios transfronteiriços entram frequentemente em conflito com os interesses nacionais.

O Financial Times noticiou, citando fontes conhecedoras do processo, que há  preocupações do executivo italiano e movimentações no setor bancário – setor no qual a Generali está bastante envolvida e que tem tido muita atividade em termos de fusões e aquisições – colocam o negócio em vias de fracassar.

O negócio está em ‘stand by’ depois de em janeiro, o grupo francês ter chegado a acordo com a maior seguradora italiana, a Generali, para juntarem as suas gestoras de ativos – a Natixis Investment Managers, do lado do BPCE, e a Generali Investments Holding, da Generali – e criarem o maior operador do setor em receitas geradas.

A transação, esperava o BPCE, devia estar concluída no final do Verão, mas o CEO já indicou que este prazo pode derrapar devido a fatores que não estão sob o controlo da instituição. Acrescentou que a fusão das empresas está “dependente do atual ambiente em Itália” e que os prazos “não estão nas mãos” do BPCE.

Caso o negócio falhe, o BPCE poderá estar pronto no próximo ano para analisar outras oportunidades em diferentes regiões geográficas, visando reforçar a sua gestão de ativos e património, segundo o FT.

Sobre a possibilidade de o negócio não seguir em frente, Nicolas Namias recusou comentar, frisando que “falar sobre um plano B significa desistir do plano A”.

Entretanto surgiu a notícia que a Procuradoria italiana suspeita que os principais acionistas do banco Monte dei Paschi di Siena (MPS) e da seguradora Generali estejam em conluio numa manipulação do mercado, para obter o controlo do Mediobanca e da seguradora Generali, evitando uma oferta pública de aquisição obrigatória. Mas a investigação poderá dar força à proposta de fusão da Natixis com a Generali na área de gestão de ativos.

A investigação do Ministério Público de Milão à aquisição do Mediobanca pelo Monte dei Paschi di Siena causou um alvoroço. Em causa um alegado “esforço concertado” envolvendo o CEO da MPS, Luigi Lovaglio, o presidente da Delfin, Francesco Milleri, e o magnata da construção Francesco Gaetano Caltagirone, para obter o controlo do Mediobanca e da seguradora Generali, evitando uma OPA obrigatória.

Entre colocações anómalas de ações do MPS e a utilização de “Golden Power” para bloquear a aquisição do Banco BPM pelo Unicredit, emerge uma complexa teia de ligações e interesses financeiros. Entre eles, destaca-se a relação entre o Mediobanca e a Assicurazioni Generali.

A investigação dos procuradores de Milão  gira em torno da oferta pública de compra e troca através da qual o MPS assumiu o controle do Mediobanca, lançando uma transação em janeiro de 2025 no valor de mais de 16 mil milhões euros em ações e dinheiro.

O Mediobanca tem sido historicamente o principal acionista da seguradora Assicurazioni Generali, e os procuradores alegam que a manipulação teve como objetivo fortalecer a influência dos dois investidores sobre o Mediobanca e a Generali.

O  jornal Il Sole-24 Ore noticiou entretanto que o regulador do mercado italiano não encontrou provas de um acordo secreto envolvendo o Monte dei Paschi di Siena e alguns dos seus acionistas para obter o controlo do Mediobanca e da seguradora Generali.

O conselho do Monte dei Paschi expressou já total confiança no CEO Luigi Lovaglio.

Recorde-se que o Governo de Itália condicionou fortemente a Oferta Pública de Aquisição do UniCredit sobre o rival Banco BPM. O banco acabou por retirar a oferta após uma luta judicial que estava a obrigar o executivo a retirar parte das suas restrições ao negócio, impostas ao abrigo dos ‘golden powers’.

O BPCE é o segundo maior banco de França e surgiu em 2009, após a fusão do Banque Populaire com o Caisse d’Epargne. Cerca de 80% das suas receitas têm origem em França e, ainda que a aquisição do Novobanco vá ter pouco impacto nas receitas vindas de Portugal, a operação permite diversificar o negócio do BPCE.

Mas também aqui nem tudo são rosas. Aquele que é um negócio de 2025 previsto para acontecer em 2026, não está isento de riscos. No dia 29 de outubro a DGTF (Direção Geral do Tesouro e o Fundo de Resolução (FdR) assinaram os acordos de venda da participação conjunta de 25% do Novobanco aos franceses. Isto depois de o BPCE ter assinado no passado dia 1 de agosto o contrato de compra e venda (SPA) de 75% do Novobanco à Lone Star. Desde logo o BPCE ter querido assinar os contratos de compra com os três acionistas ao mesmo tempo e no mesmo dia, mas surgiram questões técnicas que impediram as entidades públicas de aderirem ao contrato de venda entre a Lone Star e o BPCE assinada no passado dia 1 de agosto.

Ultrapassadas as questões técnicas a venda de 100% do Novobanco ficou acordada no fim do outubro. Entretanto a Comissão Europeia já aprovou, ao abrigo do Regulamento de Fusões da UE, a aquisição do controlo único do Novobanco (Portugal) pelo BPCE (França). A Comissão concluiu que a transação não suscitaria preocupações em matéria de concorrência, dada a limitada posição de mercado das empresas envolvidas após a transação proposta. A transação notificada foi examinada ao abrigo do procedimento simplificado de análise de fusões.

Mas o CEO do BPCE, Nicolas Namias, tinha acabado de entrar no Salão Nobre do Ministério das Finanças português no dia 29 de outubro para formalizar um dos maiores negócios do banqueiro francês, a aquisição do Novobanco por 6,4 mil milhões de euros, quando o Novobanco estava a ser alvo de buscas judiciais relacionadas à venda de ativos herdados do BES.

As buscas judiciais da operação intitulada “haircut” referiam-se à venda de ativos durante o período de gestão da Lone Star, marcado por várias transações de crédito malparado e imóveis abaixo do valor do balanço  banco, daí a designação de haircut (desconto).

O comunicado do Ministério Público referia “factos suscetíveis de constituírem a prática de crimes de corrupção ativa e passiva no setor privado, de burla qualificada e de branqueamento de capitais, no contexto da venda de ativos do Novobanco, desde o ano de 2018”. A PJ também envolvida na investigação refere operações com imóveis que geraram “avultados prejuízos”. Em causa estão vários negócios de propriedades na mata de Sesimbra, pertencentes ao Novobanco e cujos processos foram conduzidos por Volkert Reig Schmidt, que tinha a liderança da GNB Gestão de Ativos, mas que já saiu do banco. O episódio estragou a festa do BPCE já que o CEO teve de sair sem declarações aos jornalistas.

“Espero que esta transação seja o exemplo na Europa, para todos os países, do que temos de fazer para assegurar a soberania financeira”, afirmou Nicolas Namias numa intervenção no Ministério das Finanças, em Lisboa, reforçando a mensagem de que o investimento de 6,4 mil milhões de euros no Novobanco representa um compromisso de “longo prazo” do BPCE em relação à economia portuguesa. Nicolas Namias, CEO do banco francês, disse ainda que esta operação deve servir de exemplo para a Europa construir a sua “soberania financeira” através da criação dos chamados “campeões europeus”.

Em Portugal, os advogados do banco francês estão a acompanhar de perto a situação depois de a sede do Novobanco ter sido alvo de buscas policiais no âmbito de uma investigação sobre suspeitas de corrupção num antigo negócio imobiliário.

Por outro lado, um  grupo de lesados do papel comercial e lesados emigrantes do BES escreveu ao presidente do grupo BPCE, e pedir-lhe que “assuma as suas responsabilidades” e assegure o pagamento da dívida pendente aos clientes de retalho. “Confiamos que o grupo BPCE, como novo proprietário do Novobanco, assumirá as suas responsabilidades e tomará as medidas necessárias para proceder à devolução das poupanças aos clientes de retalho lesados, vítimas daquela que foi a maior fraude bancária cometida dentro de uma instituição financeira na União Europeia”, lê-se num email enviado na passada quinta-feira ao presidente do grupo francês, Nicolas Namias.

Este grupo de lesados não aderiu à solução encontrada para os lesados do papel comercial do antigo Banco Espírito Santo (BES), através da qual investidores recuperaram parte do investimento, em 2017, por discordarem da forma como este mecanismo foi desenhado e exigirem a devolução total do montante que tinham aplicado.

Numa entrevista no Verão ao Financial Times (FT), Nicolas Namias defendeu que são precisos bancos que tenham dimensão para financiar aquelas que são as iniciativas sublinhadas pelos Relatórios de Mario Draghi e de Enrico Letta. “Muito se fala do relatório Draghi ou do relatório Letta, o que é bom. Mas agora precisamos de atores que possam implementar estas iniciativas e de governos que os apoiem”, disse o CEO do BPCE ao FT.

A operação policial no Novobanco, no âmbito de uma investigação sobre suspeitas de corrupção num antigo negócio imobiliário, e a crescente oposição à fusão entre a Natixis Investment Managers e a GIH lançaram uma sombra sobre o que seriam dois dos maiores negócios da Europa. Ambas as transações servem agora como um forte lembrete de que, no complexo mundo das finanças europeias, as aquisições continuam a estar repletas de riscos ocultos e complicações imprevistas.


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