Na ressaca de mais uma black friday, importa lembrar, sem moralismos ou diatribes contra o capitalismo, que a poupança em Portugal se encontra num nível historicamente baixo.

A cair pelo terceiro ano consecutivo, a taxa de poupança (parte do rendimento disponível que não é aplicada em consumo) quedou-se pelos 4,6% em 2018. Ou seja, foram amealhados apenas 4,6 euros por cada 100 euros de rendimento disponível. Trata-se do valor mais baixo desde, pelo menos, 1999.

O consumo – que é um estímulo ao crescimento económico mas também um inibidor de poupança, um indutor de importações e um potencial fator de insustentabilidade ambiental – não explica cabalmente a fraca disposição dos portugueses para aforrar.

Há questões estruturais que justificam a falta de poupança, como a iliteracia financeira, a confiança excessiva na capacidade protetora do Estado e a cultura imediatista que prevalece sobre a gestão de longo prazo. A tudo isto somam-se questões conjunturais que desmotivam a poupança, como as baixas taxas de juro dos depósitos, a rentabilidade do investimento no mercado imobiliário e a escassez de instrumentos de aforro atrativos.

A falta de hábitos de poupança acarreta riscos acrescidos no atual cenário de progressiva insustentabilidade financeira do Estado social, provocada pelo envelhecimento demográfico. Prevê-se que as futuras reformas sejam significativamente mais baixas, podendo representar apenas 50% dos salários hoje auferidos.

Além disso, os sistemas públicos de saúde viram os seus custos disparar com o aumento da esperança de vida – e consequente agravamento de doenças crónicas – e os avultados investimentos em inovação terapêutica. Por isso, os utentes tendem a comparticipar mais os seus cuidados de saúde.

Daqui resulta uma necessidade maior de economizar por parte dos cidadãos. Necessidade, essa, que decorre também do aumento da instabilidade laboral e consequentemente de rendimentos. A dinâmica económica atual leva as pessoas a mudarem várias vezes de emprego, muitas vezes intercalando com períodos de estudo. Ora, para enfrentar esta inconstância profissional – que, para os millennials, advém também do desejo de encontrar sempre novas oportunidades de carreira – é necessária uma almofada de poupança.

Por fim, os baixos níveis de poupança penalizam fortemente o investimento. Isto porque são os depósitos bancários que, em grande medida, financiam o crédito que é concedido pelos bancos às empresas. Não é por acaso que, nas economias europeias mais dinâmicas, a taxa de poupança das famílias ronda os 10% do PIB, ao passo que, em Portugal, se fixa entre os 4 e os 5% do produto. Ora, sem investimento estamos a comprometer o futuro do país.

Neste cenário, há que atuar em duas vertentes: por um lado, na promoção da literacia financeira e na sensibilização para hábitos de consumo mais sustentáveis e, por outro, na criação de instrumentos de poupança e incentivos fiscais qJosé Pedroue motivem as famílias e as empresas a aforrarem.