O Novo Banco apresenta os seus resultados de 2020 e são particularmente importantes porque se trata do último ano de limpeza do balanço, tal como acordado com a DG Comp europeia, no âmbito da venda de 75% do banco à Lone Star, mantendo o Fundo de Resolução 25%, por autorização de Bruxelas.
O banco apresenta resultados num contexto especialmente complexo, desde logo porque a chamada de capital do Novo Banco ao Fundo de Resolução está condicionada pelo teto político de 480 milhões de euros, avançado, numa entrevista, pelo ministro das Finanças, João Leão.
Este valor avançado por João Leão é um arredondamento do valor inscrito no Orçamento de Estado 2021 (de 476,6 milhões de euros) que entretanto foi travado na votação no Parlamento, pelo voto, entre outros, do maior partido da oposição.
A apresentação de resultados do banco surge numa altura em que decorre uma Comissão Parlamentar de Inquérito às perdas registadas pelo Novo Banco e imputadas ao Fundo de Resolução.
Depois dos prejuízos de 853 milhões de euros até setembro, são esperados prejuízos anuais do Novo Banco que podem rondar os mil milhões de euros. O ano de 2020 é o último ano de limpeza do legado do BES, o que, “aliás, fazia parte do enquadramento dos acordos realizados em 2017”, já disse publicamente o CEO.
Recorde-se que em dezembro do ano passado, António Ramalho, numa entrevista ao programa “Negócios da Semana” da SIC Notícias, admitiu que, tendo em conta os prejuízos do banco até setembro (de 853 milhões de euros), o Novo Banco vá ter prejuízos anuais de mais de mil milhões, “em linha com o que orçamentámos”.
Em junho, quando o banco tinha 555,3 milhões de prejuízos, o Novo Banco estimava pedir ao Fundo de Resolução 176 milhões.
É já senso comum que Novo Banco deverá hoje anunciar que irá precisar de pedir ao Fundo de Resolução mais do que 480 milhões de euros referidos pelo ministro das Finanças e menos do que os 914 milhões de euros que ainda restam ao Mecanismo de Capitalização Contingente, e que tem validade até 2026.
Há várias operações a “pesar” e outras a “aliviar” a chamada de capital ao Fundo de Resolução.
Tal como o Jornal Económico (JE) avançou, o Novo Banco (NB) obteve autorização da DG Comp para não constituir as imparidades adicionais previstas no plano de restruturação de 2017. Isto significa 150 milhões de euros que vão pesar menos na fatura do Fundo de Resolução (FdR).
Trata-se do compromisso previsto no nº 31 do plano que foi assinado no contexto de “Ajuda de Estado” ao Novo Banco, quando foi autorizada a venda do banco de transição à Lone Star, mantendo o Fundo de Resolução 25% do capital. Esse compromisso, imposto por Bruxelas, obrigava o banco a constituir imparidades adicionais de até 150 milhões de euros em 2020 (ano de conclusão da limpeza do balanço do banco) caso o Novo Banco não atingisse um determinado nível de redução de ativos problemáticos que estão fora do mecanismo de capitalização contingente (CCA). Esse nível era medido pelo valor das imparidades para crédito, constituídas até ao fim do ano passado, para créditos em incumprimento que não estavam cobertos pelo CCA do Fundo de Resolução. Ora, o Novo Banco não atingiu o nível de imparidades previsto para esses créditos, o que obrigaria imediatamente à constituição de uma imparidade adicional de cerca de 150 milhões (ligeiramente abaixo desse valor).
Mas em negociações agora com Bruxelas, o Novo Banco conseguiu livrar-se dessa obrigação e assim evitar que os prejuízos do banco, que servem de base à chamada de capital ao Fundo de Resolução, sejam avultados.
Há no entanto fatores que podem pesar no valor a pedir ao Fundo de Resolução, desde logo um reforço de imparidades para a exposição a Angola, pois o reembolso do empréstimo subordinado por parte do Banco Económico está em risco, tal como noticiado nesta edição pelo JE.
As contas de 2020 já devem refletir aumento do risco com a emissão de dívida do Banco Económico, dada a “gravíssima situação financeira” do banco angolano. Tal como noticiou o JE esta sexta-feira, o Banco Económico que tem em aberto por reembolsar 340 milhões de dólares (288 milhões de euros), depois de em 2020 o ex-BESA ter pago uma tranche de 85 milhões de dólares de uma emissão de dívida subordinada de 425 milhões de dólares (360 milhões de euros) que o banco português subscreveu em 2014, no âmbito da intervenção estatal no BESA.
Esta exposição está protegida pelo mecanismo de capital contingente e qualquer reforço de imparidades agrava a fatura do Fundo de Resolução.
Também a sucursal em Espanha, que está em processo de venda, pode gerar mais imparidades em face das baixas propostas pelo ativo. As imparidades da operação em Espanha impactaram nos prejuízos do Novo Banco até setembro e o CEO explicou na altura que estes foram influenciados por três fatores, incluindo os 727,7 milhões de imparidades e provisões, em resultado da descontinuação do negócio em Espanha (reconhecimento de perdas).
A sucursal em Espanha não está protegida pelo Mecanismo de Capital Contingente (CCA), mas, e tal como está definido no Acordo de Capitalização, o montante dos pagamentos a realizar pelo FdR corresponde ao menor de dois montantes: perdas líquidas acumuladas nos ativos cobertos pelo CCA, e o montante necessário para repor o rácio de capital do NB no nível acordado (CET 1 de 12%). Pelo que os prejuízos do banco podem aumentar a chamada de capital. É verdade que o banco está agora a beneficiar da flexibilização temporária dos rácios regulatórios, concedida pelo BCE em contexto de crise pandémica, e isso dá alguma folga ao Novo Banco que está autorizado a operar com um rácio de CET1 de 6,2%, mas o banco não tem outra forma de reforçar o capital a não ser através do FdR, enquanto estiver em vigor o mecanismo de capitalização contingente.
O jornal “Expresso” avançou com outra operação já conhecida e que pode impactar na chamada de capital ao Fundo de Resolução. Trata-se do diferendo entre o Novo Banco e o FdR, por conta do impacto da adoção da norma contabilística (IFRS9), e que está em discussão no Tribunal Arbitral, pode aumentar a fatura do FdR. Recorde-se que há 226 milhões que podem vir a ser pedidos ao Fundo de Resolução, caso a decisão do tribunal arbitral seja favorável ao banco.
A outra operação que pode ter afetado as contas do Novo Bancos em 2020 é a venda dos fundos de recuperação geridos pela ECS Capital, tal como já noticiado pelo JE. O NB tem na sua carteira de títulos investimentos em fundos de reestruturação, que estão maioritariamente protegidos pelo CCA (mecanismo de capitalização contingente).
As propostas não vinculativas avaliam aqueles ativos que estão no balanço dos bancos em cerca de 1.000 milhões de euros, abaixo do net asset value de 1.500 milhões. Portanto o impacto nas contas depende do quão próxima a avaliação independente feita pela Alvarez & Marsal está do valor das propostas oferecidas à ECS.
Quem apura o valor a pedir ao Fundo de Resolução é o agente de verificação, a Oliver Wyman, com base em contas fechadas e auditadas.
Os números apresentados hoje prometem desiludir o Ministro das Finanças, que numa entrevista disse que “esperamos que possa ser um valor dessa ordem de grandeza [480 milhões de euros] ou inferior, e é esse trabalho que agora tem de ser feito pelas autoridades, pelo regulador e pelo FdR para garantir que há uma análise rigorosa das contas em defesa do interesse público”, afirmou adiantando que “há uma auditoria em curso que tem de preceder qualquer transferência”, referindo-se à auditoria da Deloitte.
O Público diz hoje que o anúncio do valor da chamada de capital do Novo Banco junto do Fundo de Resolução está iminente, mas o Governo aguardará o resultado da auditoria da Deloitte para dar o aval (ou não) ao novo pedido de fundos públicos.
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