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Num mundo cada vez mais inseguro, China e EUA ensaiam reaproximação

O mundo só aparentemente, ou pro breves instantes, ficou mais seguro depois do fim da União Soviética. China e Estados Unidos, as duas novas potências, aproximaram-se e afastaram-se, mas finalmente parecem ter compreendido que a cooperação mútua pode ser um bom caminho.
5 Novembro 2023, 16h30

China e Estados Unidos discutirão ao longo desta semana o controlo de armas nucleares, sendo as primeiras conversas deste tipo desde o governo norte-americano liderado por Barack Obama (que deixou a Casa Branca em 2017. As negociações serão lideradas por Mallory Stewart, um alto funcionário do Departamento de Estado, e Sun Xiaobo, chefe do departamento de Controlo de Armas do Ministério das Relações Exteriores da China.
O Ministério disse que os dois países realizarão “consultas sobre controlo de armas e não proliferação” – num quadro em que a Rússia está a retirar-se dos tratados internacionais que a obrigavam, juntamente com os Estados Unidos exatamente a esse controlo e a essa não-proliferação.
A estratégia do presidente que substituiu Obama, Donald Trump, foi precisamente no sentido contrário: a China passou a constar do topo da lista dos inimigos de ‘estimação’ dos norte-americanos e as duas potências passaram a evoluir em regime solitário e a maior parte do tempo em competição. A chegada do democrata Joe Biden à Casa Branca não mudou nada da substância da estratégia de Trump. Pelo contrário, a utilização da China como uma espécie de ‘espelho retorcido’ das opções norte-americanas demonstrou ter tanta ou mais tração entre os democratas que aquela que tinha entre os republicanos.
O início da guerra na Ucrânia veio alertar os norte-americanos para a possibilidade de o mundo regressar à fase bipolar em que viveu entre 1945 e 1991 e para a evidência de que isso seria inevitavelmente um foco de alta tensão entre os dois blocos – tanto mais que está nas mãos da China incorporar as ‘vontades’ da ex-suprerpotência russa, a que se acrescentam as estratégias do chamado Sul global. Uma má opção, portanto, para os Estados Unidos – que só podem contar com a ‘fidelidade’ dos britânicos, dos japoneses, dos australianos, dos sul-coreanos e dos europeus (com algumas reticências claras, como são os exemplos da Alemanha e da França).

Marcha atrás
Talvez esteja portanto na hora de parar e fazer ‘marcha atrás’. Depois das negociações em torno do nuclear, segue-se a uma visita a Washington do ministro dos Negócios Estrangeiros chinês, Wang Yi.
Recorde-se que a China tem mais de 500 ogivas nucleares operacionais no seu arsenal e provavelmente terá mais de mil até 2030, disse o Pentágono em outubro. Mas Pequim há muito argumenta que os Estados Unidos já têm um arsenal muito maior: a Rússia e os norte-americanos juntos possuem quase 90% de todas as armas nucleares do mundo – com os Estados Unidos a responderem por mais de 3.700 ogivas.
Mais adiante, logo se verá quando (mas talvez já este mês), os dois países têm em vista um provável encontro entre o presidente Joe Biden, e o seu homólogo chinês, Xi Jinping, em São Francisco.
A evidência de que o ‘desinteresse’ da China e dos Estados Unidos um pelo outro voltou a ficar clara na semana anterior, quando chefias militares chineses e russos convergiram num fórum de segurança em Pequim, inaugurado na passada segunda-feira. E onde os Estados Unidos foram alvo de várias críticas comuns. Mas o que importa salientar é que o segundo comandante militar mais graduado da China prometeu aumentar os laços de defesa com Washington.
O Fórum de Xiangshan, a maior mostra anual de diplomacia militar da China, é suficientemente importante para os Estados Unidos se terem dado ao luxo de a ignorar: uma delegação norte-americana deslocou-se à cidade chinesa. Onde por acaso também estava o ministro da Defesa russo, Sergei Shoigu.
Zhang Youxia, vice-presidente da Comissão Militar Central da China, fez, segundo as agências internacionais, críticas veladas aos Estados Unidos e aos seus aliados, acusando “alguns países” de tentar minar o governo chinês. Mas também enfatizou a necessidade de melhorar os laços militares com os Estados Unidos. “Aprofundaremos a cooperação estratégica e a coordenação com a Rússia e estamos dispostos a, com base no respeito mútuo, na coexistência pacífica e na cooperação, desenvolver laços militares com os Estados Unidos”, disse.
O Departamento de Defesa dos Estados Unidos enviou uma delegação liderada por Cynthia Xanthi Carras, diretora do Gabinete do Subsecretário de Defesa. Segundo as mesmas fontes, Carras teve uma breve conversa com o porta-voz do Ministério da Defesa, Wu Qian.
Recorde-se também que, na semana passada, o principal diplomata da China, Wang Yi, reuniu com Biden por uma hora, numa conversa que a Casa Branca descreveu como uma “boa oportunidade” para manter abertas as linhas de comunicação entre os dois rivais.
O encontro entre Biden e Wang Yi foi também importante para que o encontro entre os dois presidentes possa acontecer. Se acontecer, sê-lo-á na cimeira da Cooperação Económica Ásia-Pacífico (APEC), que se realiza em São Francisco, Califórnia, em meados de novembro. Mas, para já, Xi Jinping ainda não confirmou a sua presença.
Segundo os jornais norte-americanos, durante o encontro com o ministro chinês, Biden apelou para que a China trabalhe com os Estados Unidos para gerirem a relação dos dois países de forma responsável e para “enfrentarem em conjunto os desafios globais”.

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