Somos descendentes do escravo e do senhor que o escravizou. A frase de Lídia Jorge nas comemorações do 10 de Junho não é só um magnífico exercício literário. É uma verdadeira interpelação política e social e uma convocatória. Uma convocatória dirigida a quem gere pessoas e empresas.
Num tempo em que a sustentabilidade deixou de ser opcional e a liderança exige visão plural, a diversidade tornou-se um fator estratégico, além do imperativo ético. É critério de valorização empresarial e afirma-se enquanto vetor de competitividade.
Estudos da McKinsey, da Harvard Business Review e da Deloitte demonstram que as empresas com equipas plurais – em perfil e experiência – resolvem melhor problemas complexos, adaptam-se mais facilmente a novos contextos e têm mais sucesso em novos mercados e diante de crises e mudanças. E, sem surpresa, são mais produtivas e rentáveis.
A matriz portuguesa é feita de intensos fluxos migratórios e entrelaçamentos culturais, por isso, o nosso capital humano é valioso e está à altura das empresas mundiais de referência.
E como qualquer capital, floresce ainda mais na arte de fazê-lo render. Os conselhos de administração ganham em ser heterogéneos e os programas de inclusão têm de passar da teoria à prática.
A nossa riqueza histórica pode e deve ser levada para a dinâmica empresarial. Porque mercadejámos escravos, mas fomos pioneiros a abolir a pena de morte. Porque herdámos o fatalismo do Velho do Restelo, mas também a coragem dos descobridores. Foi nesta linha, a proposta de Lídia Jorge, no seu discurso do 10 de Junho: fazer da memória uma ferramenta de liderança. Saber de onde vimos é essencial para criar organizações robustas, flexíveis e eficazes – seja nas famílias, nas comunidades ou nas estruturas das empresas. A exemplo das pontes japonesas, concebidas para resistir a ciclones e sismos, as empresas mais sólidas são as que combinam estabilidade com flexibilidade, o que exige reconhecer que a diversidade é um ativo.
No plano económico, pessoas diferentes, com histórias de vida diferentes, criam equipas mais coesas, com maior capacidade de compreensão, tomam decisões mais estratégicas e voltadas para o futuro.
O pilar “S” do ESG é exatamente sobre isso: diversidade, pluralidade e responsabilidade social com métricas claras. Não basta missão, visão e valores alinhadas com a cultura da empresa – nem mesmo nos relatórios de indicadores não financeiros. Ética e propósito nos negócios valem mais do que lucros e condecorações, porque a má fama corre mais rápido do que o campeão olímpico dos cem metros.
Para os líderes empresariais, a pergunta é clara: vão continuar no conforto dos boards homogéneos, a gerir equipas de yes men ou vão ter coragem para transformar a heterogeneidade humana num trunfo?
Como Darwin provou, não foi o mais forte nem o mais inteligente que sobreviveu, mas sim o que melhor se adaptou à mudança. Também entre os humanos.