As notícias da minha morte são manifestamente exageradas. A frase, atribuída a Mark Twain, é um lugar-comum tão gasto como o olhar desalentado que os portugueses têm sobre o país. Esta falta de autoconfiança agora infetou em cheio a opinião sobre o projeto europeu. A ação desmiolada de Donald Trump – ele não pensa, logo existe – foi o suficiente para abrir a porta deste labirinto emocional que nos convida à autocomiseração e a um fatalismo desprovido de racionalidade.

A Europa tem problemas. Tem regras a mais e empresas competitivas a menos. Não tem massa crítica tecnológica e demora uma eternidade a tomar decisões. Ficou amarrada à indústria alemã e ao diktat germânico. Ainda assim, continua a ser o espaço democrático mais sólido do mundo e a organização política onde os direitos, liberdades e garantias são mais respeitados. Não é coincidência a imigração de americanos para a UE: eles encontram aqui o contexto que estão a perder nos EUA – estes quatro anos de Trump vão demolir um pouco mais este extraordinário edifício capitalista. Ele não morrerá, mas deixará um lastro de destruição. Este golpe de Estado em curso não nos deve deprimir e menos ainda levar-nos a copiar a deriva do Bokassa do imobiliário.

O projeto europeu é complexo, gerir 27 países é espinhoso e até frustrante, mas como diria Galileu Galilei… e pur si muove. É fundamental criar um exército da UE e uma indústria militar autónoma. O que fizemos com a Airbus, hoje mais competitiva do que a Boeing, é o modelo a replicar. Não sabemos se um dia seremos uma federação, se vamos ter um presidente eleito por sufrágio direto e se teremos um comissário dos negócios estrangeiros com poder de decisão. Não sabemos, mas tudo isso está à nossa frente. Até lá, não nos deixemos amedrontar pela vulgaridade do amigo de Putin.